ECONOMIA NACIONAL

Alugar próprio carro a desconhecidos vira salário extra.

Proprietários chegam a receber mais de R$ 1 mil por mês.

Em 30/07/2016 Referência CORREIO CAPIXABA - Redação Multimídia

Carro não é mais um "xodó": se empresta sim, e até mesmo para desconhecidos. A prova de que a relação com o automóvel está mudando é o aumento no número de brasileiros que usam empresas de compartilhamento para alugar o próprio carro, por algumas horas ou dias.

Pelo menos 3 empresas apareceram nos últimos 2 anos, e já somam cerca de 28 mil usuários e quase 3 mil carros cadastrados - sem excluir os que estão em mais de uma plataforma.

O Fiat Bravo 2014 completíssimo do engenheiro Luan Bertuoli, de 28 anos, pode ser alugado por R$ 179 por dia, ou R$ 18 a hora, em São Paulo.

O valor é até 30% mais barato que um similar com os mesmos opcionais em locadoras tradicionais.

“Fiquei desempregado e isto está me ajudando a manter o carro. Não precisei me desfazer dele. Com o aluguel, pago a prestação e ainda sobra dinheiro”, conta Bertuoli, que começou a usar o sistema há apenas 3 meses.

Seja por causa de dificuldades financeiras ou por uma mudança na maneira de ver um bem parado na garagem, gerando apenas despesas, o negócio se tornou uma fonte de renda para proprietários, que chegam a receber mais de R$ 1 mil por mês na conta bancária.

Como funciona
Funciona basicamente assim: o dono cadastra seus dados e os do carro em um site, a empresa checa as informações com o Detran, verifica e-mail, celular e redes sociais.

Caso seja aprovado, o “anúncio” vai ao ar, para que interessados façam suas reservas.

Antes de aceitar um pedido, o proprietário pode ver detalhes de seu "cliente", como número de telefone, avaliação feita por outros usuários, comentários, perfil do Facebook e ainda trocar mensagens ou telefonar, caso haja alguma dúvida.

Depois disso, basta combinar o local de entrega. O pagamento é feito por meio eletrônico, sem entrega de dinheiro vivo. Após a locação, os dois ainda podem fazer avaliações nos sites, que ajudam a escolher bons proprietários e motoristas. Veja 3 opções disponíveis no Brasil:

Carros compartilhados: Fleety, Pegcar e Parpe (Foto: Arte/G1)

O corretor de seguros Jefferson Floriano, de 45 anos, também de São Paulo, disponibiliza um Ford Focus e um Peugeot 207 para aluguel e diz ganhar R$ 1 mil por carro ao mês, em média. “Queria monetizar um produto que era subutilizado. Moro perto do escritório e posso ir trabalhar a pé”, afirmou.

As plataformas de compartilhamento também ficam com a sua parte. Cada uma tem suas próprias taxas explicadas nos sites, mas, na média, elas giram em torno de 20%. Ou seja, um carro listado por R$ 100 dará R$ 80 ao dono no fim da diária.

E se bater?
Conseguir um seguro para as locações foi o maior obstáculo para o início do compartilhamento entre pessoas no Brasil. “Foram mais de 100 reuniões com seguradoras e 37 nãos”, lembra Guilherme Nagüeva, um dos sócios da Fleety, que foi a primeira deste tipo a operar no país, em setembro de 2014. Atualmente, ela atua nas regiões metropolitanas de São Paulo, Rio de Janeiro, Curitiba e Florianópolis.

A saga terminou com a criação de uma apólice modular sem burocracias, com cobertura de colisão, incêndio, roubo, furto, assistência 24h, responsabilidade civil e de pagamento de 100% da tabela Fipe, que vale durante todo o período do aluguel. E o valor já está incluso na diária.

Embora as plataformas aceitem apenas carros já segurados, o seguro do proprietário não é usado, e o valor da franquia é pago pelo motorista que alugou o carro, em caso de acidente.

“Na primeira vez fiquei o dia inteiro meio ‘assim’ porque o carro estava com outra pessoa, mas foi só na primeira vez, depois passou”, disse a bióloga Gabriela Marin, de 28 anos, que disponibiliza seu Honda Fit 2010 por uma diária de R$ 114 na capital paulista.

De acordo com Sérgio Barros, diretor do grupo BB e Mapfre, o índice de sinistros envolvendo carros compartilhados é baixo. “Em grande parte, são colisões com danos leves e baixo valor de reparação, mas já tivemos episódios de roubo”, afirmou.

Como o aluguel é feito entre pessoas físicas, possíveis problemas devem ser resolvidos entre as duas partes, mas as plataformas de compartilhamento ajudam na solução com formulários para transferência de pontos de multa e “check-list” de itens do carro, riscos e amassados pré-existentes.

“Não tive problema nenhum até hoje, apesar de já terem tomado multa, quebrado lanterna, amassado a porta. Tudo foi resolvido sem precisar da empresa. Tem dado certo. O pessoal transfere as multas e paga direitinho”, conta Floriano.

Viagem com a família
A ideia de compartilhar bens e serviços está crescendo no Brasil, principalmente com o avanço do Uber, mas também com o AirBnb, onde é possível alugar sua casa ou um quarto para turistas, e outras novidades que envolvem refeições caseiras, vagas de garagem, roupas e até malas de viagem.

A ideia de compartilhar bens e serviços está crescendo no Brasil, principalmente com o avanço do Uber, mas também com o AirBnb, onde é possível alugar sua casa ou um quarto para turistas, e outras novidades que envolvem refeições caseiras, vagas de garagem, roupas e até malas de viagem.

“Pela primeira vez estou em um hostel com a família, peguei Uber pela primeira vez e agora vou pegar o carro do Ricardo para ir até Campos do Jordão. Achei maravilhoso”, disse o empresário Eivan Farias, de Belém, que foi passar férias em São Paulo, com a mulher e 3 filhos.

Carro cuidado
De acordo com os sócios da PegCar, que começou a operar em outubro do ano passado no estado de São Paulo, os carros são bem cuidados. “Este componente, de ser um negócio entre pessoas, faz com que o condutor cuide muito mais do carro do que se fosse de uma locadora convencional”, afirma Bruno Hacad.

São aceitos somente carros e utilitários leves particulares com a documentação em dia, sem personalizações excessivas, como blindagem e rebaixamento. Algumas plataformas também limitam a idade, a quilometragem rodada e o valor do carro.

Já para quem quer alugar um carro, é preciso ter carteira de habilitação (CNH) válida ou permissão para dirigir. Algumas empresas exigem pelo menos 2 anos de habilitação, um cartão de crédito para as transações e perfil no Facebook.

Todos os cadastros devem ser aprovados pelo site, que faz checagem dos dados, inclusive de antecedentes criminais e situação financeira.

De acordo com Guilherme Cury, gerente de operações do Parpe, que tem mais de 600 carros cadastrados em todo o Brasil, a plataforma pede outros documentos em casos de suspeita de fraude. “Até agora, apenas 3 não enviaram os documentos adicionais e não foram aprovadas. A nossa função é conectar as pessoas e fazer com que a transação seja segura.”, afirmou.

Em 3 meses, superou 2015
Compartilhar o carro é a apenas uma parte do movimento, mas que era visto como “quase impossível”, por causa da fama do brasileiro de ser apegado e tratar o veículo como se fosse um filho.

“Os primeiros 50 carros foram no ‘gogó’. Fizemos visitas pessoalmente tentando convencer as pessoas”, lembra Conrado Ramires, sócio da PegCar.

“A gente vive um momento em que o cara deixa de olhar para o carro como um xodó. Quando entra o componente financeiro, ele passa a olhar de maneira mais funcional. E o fator ‘renda extra’ é muito marcante”, completa Hacad.

“Nos primeiros 3 meses deste ano, batemos o volume de transações do ano passado inteiro, que foi de 1,1 mil locações. É um avanço médio de 30% a 40% por mês”, afirmou Nagüeva, da Fleety. A start-up, que começou com os sócios “quebrando os cofrinhos”, está avaliada em cerca de R$ 20 milhões.

E isto pode ser só o começo. As plataformas planejam expansões para atuar com força em todo o Brasil, já olham outros países da América Latina e também outros veículos que podem ser compartilhados, como barcos, motocicletas e bicicletas.

Auto Esporte/g1