CIÊNCIA & TECNOLOGIA

Aplicativo de celular ajuda no diagnóstico da malária.

A malária é causada pelo parasita unicelular protozoário Plasmodium.

Em 29/07/2015 Referência CORREIO CAPIXABA - Redação Multimídia

Com o objetivo de facilitar o diagnóstico de malária em áreas remotas do globo, está sendo desenvolvido por pesquisadores da Biblioteca Nacional de Medicina dos Estados Unidos um aplicativo para smartphones que utiliza um sistema automatizado para detecção e contagem de parasitas da doença.

A tecnologia foi apresentada no IEEE International Symposium on Computer-Based Medical Systems (CBMS), realizado, com apoio da FAPESP, de 22 a 25 de junho no Instituto de Ciências Matemáticas e de Computação (ICMC), em São Carlos, e na Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto (FMRP), ambos da Universidade de São Paulo (USP).

“A malária é uma doença curável, mas diagnósticos inadequados e a resistência às drogas emergentes ainda são barreiras para a redução da mortalidade. É preciso desenvolver vacinas e controlar o mosquito transmissor, entre outras medidas, mas o desenvolvimento de um teste para diagnóstico rápido e confiável é uma das formas mais promissoras de combate à doença”, explicou Sameer Antani, da Biblioteca Nacional de Medicina, ligada aos National Institutes of Health (NIH).

Para isso, disse o pesquisador, foi necessária interação entre profissionais da saúde, cientistas da computação e engenheiros.

“Foi do diálogo entre as necessidades clínicas do cuidado com a saúde da população no campo e engenheiros e pesquisadores de áreas ligadas à computação que surgiu essa nova abordagem de combate à malária, desenvolvida para atender à demanda urgente pelo controle da doença, mas de forma adaptada à realidade do trabalho em áreas com necessidades muito particulares”, contou.

Agma Traina, do ICMC e da coordenação do CBMS, destacou que essa interação tem gerado contribuições para a prática médica, mas que é preciso promover mais diálogo.

“A programação do CBMS buscou abordar diferentes formas de integração entre a computação e a medicina em benefício da população, duas áreas que já dialogam, a exemplo das muitas pesquisas e tecnologias apresentadas ao longo do evento, mas que precisam interagir cada vez mais. De um lado, cientistas da computação e matemáticos precisam conhecer e compreender as necessidades dos profissionais da saúde no diagnóstico e no tratamento de doenças; do outro, os médicos e pesquisadores da área precisam visualizar o potencial que a computação tem de auxiliar na sua atuação.”

Para automatizar a detecção e contagem de parasitas da malária, relatou Antani, o projeto contou com o apoio do Departamento de Saúde e Serviços Humanos do país e com uma parceria de pesquisa entre a Mahidol University, da Tailândia, e a Oxford University, do Reino Unido, que juntas criaram a Mahidol Oxford Tropical Medicine Research Unit.

“Cuidado: parasita!”

A malária é causada pelo parasita unicelular protozoário Plasmodium, transmitido pela picada da fêmea infectada do mosquito Anopheles. O diagnóstico da doença é feito com a ajuda de exames microscópicos, que possibilitam identificar os parasitas em amostras de sangue.

De acordo com Antani, mais de 170 milhões de filmes de sangue são examinados a cada ano com esse fim e a contagem dos parasitas para definir se os casos diagnosticados são graves ou não complicados, seguindo a classificação da Organização Mundial de Saúde (OMS), geralmente é manual.

“A contagem precisa desses parasitas é fundamental para o diagnóstico correto da doença e para o sucesso do tratamento, influenciando, por exemplo, na eficácia das drogas. No entanto, os diagnósticos microscópicos não são padronizados e dependem muito da experiência e da habilidade do microscopista”, avaliou.

Para o pesquisador, isso dificulta o diagnóstico e o controle da malária em locais com poucos recursos e com alta incidência da doença.

“Essa dificuldade pode levar a decisões equivocadas no tratamento. Nos casos de falso negativo, além dos danos óbvios à saúde do indivíduo infectado, isso significa a necessidade de uma nova consulta, dias perdidos de trabalho, recursos gastos desnecessariamente. Já nos casos de falso positivo, o diagnóstico pode levar ao uso desnecessário de medicamentos e a sofrimento por conta de uma série de potenciais efeitos colaterais, como náusea, dores abdominais, diarreia e complicações graves”, ponderou.

A solução desenvolvida pelos pesquisadores automatiza a detecção do parasita e sua contagem a partir de esfregaços de sangue, uma camada fina de sangue disposta sobre uma lâmina de microscopia e que é colorida de forma a permitir que diferentes células sejam examinadas.

Antani explicou que a contagem automatizada dos parasitas tem uma série de vantagens se comparada ao método convencional.

“Além de fornecer uma interpretação mais segura, essa automatização reduz custos e possibilita que mais pacientes sejam atendidos em menos tempo, facilitando o trabalho em campo nas áreas de maior incidência da doença.”

O sistema funciona por meio de métodos de aprendizagem de máquina, campo da inteligência artificial que desenvolve algoritmos e técnicas que permitem ao computador apreender determinados padrões para aperfeiçoar seu desempenho em tarefas específicas.

Com base em padrões de imagens digitais adquiridas por equipamentos de microscopia de luz convencionais, o software “aprende” a aparência típica dos parasitas e os identifica em fotografias dos esfregaços de sangue, realizando em seguida sua contagem e discriminando as células infectadas.

Aplicada a smartphones, a tecnologia se torna portátil e pode ser levada a campo. Para Antani, o desenvolvimento do sistema pode beneficiar populações de diferentes nações que ainda sofrem com a malária, como o Brasil.

“A malária mata mais de 600 mil pessoas por ano, a maioria na África, onde uma criança morre a cada minuto vitimada pela doença. Muitas que sobrevivem acabam sendo acometidas por deficiências neurológicas. Mas a malária é um problema global: são cerca de 200 milhões de casos em todo o mundo, incluindo o Brasil. O desenvolvimento de uma tecnologia portátil de baixo custo e alta precisão para diagnóstico da doença tem grande potencial para auxiliar no combate à doença e nos esforços pela sua erradicação.”

De acordo com a OMS, o Brasil reduziu em 75% o número de infecções em território nacional desde 2000, mas a incidência da doença ainda é alta, especialmente na Amazônia: em 2013 o país teve 177.767 casos diagnosticados e 41 óbitos foram registrados.

Tuberculose

Antani também falou no CBMS do desenvolvimento de algoritmos avançados para detectar automaticamente sinais de tuberculose pulmonar e outras doenças em radiografias de tórax, a fim de simplificar o procedimento e levá-lo a áreas remotas do planeta onde há escassez de radiologistas.

Esses algoritmos são aplicados a unidades móveis de raio X, facilmente transportáveis a zonas rurais. O projeto piloto dos pesquisadores atua em regiões da África em que há prevalência de infecções pulmonares em pacientes portadores do vírus HIV, especialmente no Quênia.

“Quando o sistema recebe uma radiografia do tórax, avalia segmentos de regiões do pulmão por meio de um método de otimização baseada em corte gráfico. Esse método combina as informações da radiografia com atlas pulmonares personalizados derivados de modelos que foram utilizados para treinar o sistema em um conjunto de características de textura e forma, que permitem que a radiografia possa ser classificada como normal ou anormal usando um classificador binário”, explicou.

Segundo Antani, o sistema de diagnóstico auxiliado por computador proposto tem desempenho que se aproxima ao de especialistas humanos e pode ajudar no combate à tuberculose em áreas remotas.

“Comparando o desempenho do sistema ao de radiologistas, a precisão do diagnóstico automatizado foi de 84%, o que representa uma grande esperança para populações que não contam com acesso fácil a esses profissionais e que são vitimadas pela tuberculose. Quando a doença não é diagnosticada e, por consequência, o paciente não é tratado, as taxas de mortalidade são elevadas”, disse.

Fonte: AGÊNCIA FAPESP