POLICIA

Brasil teve em média 143 assassinatos por dia em 2014.

Especialistas apontam medidas para tentar reduzir o alto número de crimes.

Em 27/07/2015 Referência CORREIO CAPIXABA - Redação Multimídia

Mais de 143 pessoas morreram por dia, em média, vítimas de homicídios dolosos (com intenção de matar) no país em 2014. É o que mostra um levantamento exclusivo realizado pelo G1 com base em dados das secretarias da Segurança dos 26 estados e do Distrito Federal. Ao total, foram 52.336 assassinatos registrados, número 3,8% superior ao de 2013 (50.413).

Houve ainda 2.061 latrocínios (roubos seguidos de morte) no ano passado. Além disso, 2.368 pessoas morreram em confrontos com a Polícia Militar. Os dados coletados pela reportagem ajudam a traçar uma radiografia da segurança no Brasil.

Considerando a quantidade de homicídios para cada 100 mil habitantes, em 2014, de acordo com os dados obtidos, o Brasil teve um índice de 25,81. A Organização Mundial de Saúde (OMS) considera que taxas acima de 10 por 100 mil habitantes configuram "nível de epidemia".

Alagoas, que desde 2006 encabeça o ranking entre os estados com a maior taxa, vem trabalhando para reduzir o indicador, mas ainda lidera, com 61,8 mortes por 100 mil. Já Mato Grosso destaca-se por ter a maior variação na taxa, que subiu 8 pontos de 2013 para 2014, passando de 31,43 mortes por 100 mil habitantes para 39,57.

O último relatório divulgado pelo governo federal, no “Mapa da Violência”, mostra que, em 2012, foram registrados 56.337 homicídios dolosos (29 mortes a cada 100 mil). O levantamento é feito com base nos números do Ministério da Saúde e mostra que, desde 2007, a taxa de homicídios do Brasil vem crescendo a cada ano.

O anuário feito pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública, que coleta estatísticas do Sistema Nacional de Informações de Segurança Pública, Prisionais e Sobre Drogas (Sinesp), do Ministério da Justiça, diz que, em 2013, houve 50.806 homicídios dolosos. Neste caso, a taxa de mortes por 100 mil fica em 25.

Renato Sérgio de Lima, vice-presidente do fórum e doutor em ciências sociais pela Universidade de São Paulo (USP), diz que os dados indicam que "não adianta mais tapar o sol com a peneira". "Duvido que alguém vai achar que quase 60 mil mortes por ano seja um número bom e deva continuar como está."

"Este é um tema que não deve mais esperar: ou nos mobilizamos ou o Brasil vai perder o protagonismo e ver deflagrada uma guerra civil, e é isso que já acontece em algumas cidades", defende Lima.

Pacto nacional
Para tentar conter o avanço dos homicídios, o Ministério da Justiça pretender lançar até o fim do ano um pacto nacional, buscando promover um acordo entre União, estados e municípios e reunindo medidas e metas contra a violência armada. 

O ex-secretário nacional de Segurança Pública e coronel reformado da PM de São Paulo José Vicente da Silva teme que a nova iniciativa seja apenas mais “um nome em uma faixa para não dizer nada”. “É preciso que as decisões sejam colocadas em prática com a participação efetiva de todos, desde o governador, os comandantes, até quem está na ponta da linha”, defende.

Já o vice-presidente do Fórum Brasileiro de Segurança Pública entende que o pacto pode se tornar uma alternativa de projeto de Estado, e não de governo. "É necessário unir esforços independente de coloração partidária", diz Renato.

Em 2012, o Ministério da Justiça lançou um programa voltado especificamente para a situação de Alagoas, implantando medidas que variavam desde a melhoria da eficiência da apuração dos crimes até o envio de peritos e de tropas da Força Nacional. Desde então, os indicadores passaram a cair.

De acordo com o Mapa da Violência, a taxa de homicídios passou de 72,2 por 100 mil habitantes, em 2011, para 64,6, em 2012. Também houve redução na taxa de 2013 para 2014, passando de 64,9 para 61,8, segundo os números do G1.

Confiabilidade dos dados
O sociólogo Julio Jacobo Waiselfisz, que realiza desde 1998 o Mapa da Violência no país, entende que a grande dificuldade de se obter dados confiáveis sobre os indicadores criminais reside no fato de não haver padronização na forma de registro. Segundo ele, os governos, muitas vezes, omitem informações.

“Há um problema de que cada estado entende homicídio de uma forma diferente. Para alguns, latrocínio entra. Em outros, se há sequestro com morte, não é registrado. Há muitos encontros de cadáver que aparecem como averiguação”, explica Jacobo. “Não dá para saber se é real [o número]”, pondera.

Jacobo, que é coordenador de estudos da violência da Faculdade Latino-Americana de Ciências Sociais, analisa, para os estudos do Mapa da Violência, as declarações de óbito: para enterrar um cadáver é preciso de um atestado de um médico legista, apontando a causa da morte. E, por isso, o levantamento demora a ser concluído, explica.

Para o estudioso, os estados do Nordeste, onde a taxa de homicídios na última década quase duplicou devido a vários fatores, como imigração, tráfico de drogas e desemprego, deveriam seguir o exemplo de São Paulo, onde a taxa de mortes por 100 mil habitantes passou de 38, em 2002, para 15,1, em 2012, segundo o Mapa da Violência. Em 2014, conforme os dados da Secretaria de Segurança Pública repassados ao G1, a taxa ficou em 10,3.

Entender os motivos do problema
“São Paulo avançou muito no combate aos homicídios a partir da virada do século, quando começou a entender as causas e onde eles estavam acontecendo e a investir nas polícias. Não significa que este problema se resolve com prevenção. Tem que fazer um diagnóstico dos problemas. Ou se faz um trabalho de médio e longo prazo, ou a violência vai seguir aumentando”, afirma Jacobo.

Já Renato Sérgio de Lima, do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, pondera que, em alguns estados, há um tripé base que atua para a queda dos indicadores:

1) a união da população, criando mecanismos de aproximar a comunidade da polícia;
2) o aperfeiçoamento da investigação e da inteligência;
3) a maior integração entre as polícias Civil, Militar, Ministério Público, Judiciário e a perícia.

A diretora da ONG Sou da Paz Carolina Ricardo defende que os estados com maior índice de homicídios comecem a atacar o problema identificando raízes e causas.

“São Paulo avançou porque resolveu parar e olhar quem mata, quem morre, onde e o porquê, além de adotar uma política de gestão integrada. No fim da década de 90, havia grupos de matadores, disputas, chacinas, muitas mortes por motivo fútil e banal. A partir do momento em que se identifica e começa a se esclarecer com inteligência, começa a se combater pela raiz”, afirma.

Um levantamento do Conselho Nacional do Ministério Público aponta que apenas entre 5% e 8% dos inquéritos que investigam homicídios no país são concluídos e levados à Justiça. A meta da Estratégia Nacional de Segurança Pública é chegar a 12%.

“O que acontece nos outros estados é que não há clareza das causas e das motivações e o número de esclarecimento dos crimes é baixo. É preciso fazer um esforço para entender isso”, defende Carolina, da ONG Sou da Paz, para quem Alagoas vem reduzindo as taxas devido ao investimento e ao trabalho conjunto.

Latrocínios
Para os especialistas ouvidos pelo G1, a repressão ao latrocínio ocorre prevenindo-se o roubo. Em números absolutos, São Paulo (383 casos), Bahia (199) e Pará (180) lideram o ranking de 2014. Já quando se fala da taxa por 100 mil habitantes, Acre (2,4) e novamente o Pará (2,23) encabeçam a lista.

“Latrocínio é um crime patrimonial que acontece em todos os lugares do mundo e que só se combate controlando o acesso a armas de fogo e direcionando o efetivo, com tecnologia e informações, para prevenir o roubo. A presença ostensiva do PM é importante como um mecanismo para evitar que venha a ocorrer, mas há outros fatores, como iluminação, presença de câmeras, que possam evitar que o crime ocorra”, reforça Renato Sérgio de Lima.

Fonte: G1