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Brasileiro vai a vilas do Nepal para documentar reconstrução do país
Fotógrafo Rafael Saes andou por 12 dias no país destruído por terremoto.
Em 12/07/2015 Referência CORREIO CAPIXABA - Redação Multimídia
Como falar sobre gente em um país coberto por escombros, reconstruções, vacas sem dono, luto? De que jeito pedir licença para bater uma foto de rostos que, há menos de três meses, inevitavelmente expressavam medo e desamparo? O fotógrafo paranaense Rafael Saes, de 28 anos, aceitou o desafio de retratar como os moradores do Nepal, país atingido por um devastador terremoto em 25 de abril, tentam se reerguer.
Os tremores deixaram mais de 8,5 mil pessoas mortas e outras milhares feridas, de acordo com as autoridades locais. É o desastre mais fatal registrado no país. Muito das ruínas, relata o documentarista, ainda está empilhado pelas ruas.
A viagem do brasileiro durou 12 dias (veja vídeo dos bastidores). Atrás de quem sofreu com a tragédia, ele caminhou pela capital, Catmandu, e por vilarejos, enfiados aos pés da Cordilheira do Himalaia. Precisou da ajuda de um local para se comunicar e entender o cotidiano dos locais. A ideia era, segundo ele, imergir no universo daquele povo, antes de fazer as fotos. (Veja algumas imagens na galeria)
"Para fazer as fotos, eu convivia com as pessoas antes. Um ponto chave é que um nativo, de confiança deles, estava nos guiando, traduzia tudo na língua deles. Sem ele, ficaria muito difícil. Mesmo assim, víamos olhares receosos, crianças assustadas. Tinha gente lá que havia visto "gente branca" duas, três vezes", conta Saes, sobre um dos vilarejos que visitou.
O nativo era Pemba Sherpa, montanhista e guia reconhecido internacionalmente pelo seu conhecimento sobre o Monte Everest, cujo pico ele já alcançou várias vezes. Ao paranaense, o nepalês contou que era a primeira vez que um brasileiro pisava em sua vila, chamada Patle - acessível apenas depois de vencidos 200 quilômetros de estrada ruim e mais 60 quilômetros de trilha, a pé.
No país de 28 milhões de habitantes, mais de 8 milhões deles foram afetados, direta ou indiretamente, pela tragédia. Uma porção deles não têm mais teto ou documentos para apresentar, de acordo com Saes. Sobrevivem apenas com a ajuda de doações, que (quando chegam) vêm de toda a parte do mundo.
Em uma das vilas nepalesas, o brasileiro lembra que não havia nem banheiro para usar. "Faça onde quiser, mas sem que ninguém veja", disse a ele um dos locais. Mesmo assim, diz o fotógrafo, a recepção era calorosa, fosse em vilas remotas ou na região central da capital.
"Em uma das visitas, dormi na casa de um casal, com três ou quatro filhos, para entender melhor a realidade deles. Eles davam o melhor lugar da casa para a gente, sempre. Nessa ocasião, a família dormiu na cozinha para que ficássemos no quarto", afirma.
O cenário nas ruas era de guerra, compara Saes. Muito prédio sendo reconstruído, muito desemprego (e, por consequência, pessoas ociosas), muita casa no chão. Ficou na memória do brasileiro a fala de um homem, de cerca de 40 anos, sobre seu lar: "Trabalhei a vida toda para construir minha casa. Vivi para isso. Quando acabei, o terremoto veio e destruiu tudo".
Ao fim da viagem, ficaram mais de mil fotos documentadas, divulgadas aos poucos por meio doInstagram de Saes. Além de retratos, ele diz ter trazido para o Brasil a lição de que "vivemos no paraíso". "Não que o Brasil não tenha problemas. Claro que tem. Mas, você começa a imaginar a quantidade de gente, ali, que perdeu pai, mãe, filho, casa. Observando o que os nepaleses estão passando, não dá para reclamar de nada por aqui".
Na bagagem, também veio mais vontade em ajudar pessoas, afirma. "O que eu sei fazer? Fotografar. É com isso que quero impactar as pessoas, socialmente. A ideia é fazer com que as fotos cheguem ao maior número de pessoas e crie nelas a vontade de ajudar outras. Que seja o vizinho, que seja no próprio bairro. Quando as pessoas saírem da zona de conforto, o mundo vai ficar melhor".
A missão
Rafael Saes foi para o Nepal junto com uma missão para doação de roupas a crianças, a convite de outro paranaense, o empresário Lucas Emmanuel Rodrigues. A ideia era levar uniformes para escolas de regiões destruídas pelo fenômeno, com registros do fotógrafo.
Rodrigues conta que fez o convite ao documentarista porque "sabia que ele seria tocado". "O trabalho ficou incrível. Acho que para o Rafa foi algo que nem ele imaginava. Me agregou muito. Teria sido muito diferente e causado menos atenção se eu tivesse ido sozinho".
Especializado em missões humanitárias, Rodrigues também afirma que ficou impressionado com a recepção dos nepaleses aos dois brasileiros. Ele diz que uma cena de gratidão dos asiáticos ficou guardada em sua memória.
"Eu estava com uns 30 kathas (um lenço dado sempre em agradecimento ou boas-vindas) em volta ao pescoço. Todos me olhavam atentamente. Fiquei arrepiado com a situação, me emocionei e o que eu pensei no momento me marcou. 'Olha onde eu estou, no meio do nada. Eles estão dando valor nesse uniforme, da mesma maneira que eu. Estão entendendo a importância e me abraçando com esses olhares'. Acho que nunca vou me esquecer desse momento".
Fonte: Reuters