ECONOMIA INTERNACIONAL
China não quer ser vilã da economia global, afirma Arthur Kroeber,
A China passa por bom momento e poderá compensar a demanda americana, diz especialista.
Em 21/03/2018 Referência CORREIO CAPIXABA - Redação Multimídia
As medidas protecionistas que o governo de Donald Trump deve anunciar ainda nesta semana contra a China não afetarão o gigante oriental no curto prazo. Segundo Arthur Kroeber, sócio-fundador da consultoria especializada em economia chinesa Dragonomics, a China passa por bom momento e poderá compensar a demanda americana aquecendo seu mercado doméstico ou aumentando exportações para outros países. Kroeber, que está no Brasil para participar de debates no Centro Brasileiro de Relações Internacionais (Cebri), no Rio e em São Paulo, diz que a China deve evitar medidas retaliatórias pesadas, pois não quer ser vista como a vilã da economia global.
O governo americano anunciou que pretende reduzir o déficit comercial com a China em US$ 100 bilhões. Quais os impactos para a economia chinesa?
O governo americano pode pedir isso, e a China responder como quiser. Acho que eles (a China) vão tentar fazer algo para aumentar as compras de bens dos Estados Unidos, mas não há muito o que fazer porque uma grande parte do déficit vem da montagem de produtos como iPhones e outros eletrônicos que a China exporta para os EUA. Por outro lado, para a China importar mais dos EUA é difícil porque é muito competitiva para fabricar produtos. Não acho que seja possível mudar muito essa balança e uma boa pergunta é: se a China não fizer nada para reduzir o déficit, qual será a resposta dos EUA?
Há possibilidade de os países encontrarem um ponto intermediário?
Eles podem reduzir um pouco, mas é preciso lembrar que os EUA vão anunciar restrições a importações chinesas.
Essa medida poderá desacelerar a economia chinesa, que é dependente de exportações?
Não acho que haverá grande impacto na economia chinesa neste ano. A economia chinesa está em boa forma, conduzida pelo setor doméstico de construção, que está sólido. As exportações para o resto do mundo também vão muito bem. Se houver redução de exportações para os EUA, o governo chinês poderá adotar estímulos domésticos. A situação da China no curto prazo ainda é bastante boa. Mas o impacto disso (das medidas protecionistas), apesar de difícil de prever, pode ser grande, mas nos próximos quatro ou cinco anos.
A China deverá responder com medidas retaliatórias pesadas?
Depende do que os EUA fizerem e de quão grande forem as tarifas impostas. A China poderá, por exemplo, adotar taxas que limitem importações agrícolas americanas ou comprar menos aviões da Boeing e mais da Airbus. Também pode criar algumas restrições para negócios americanos que operam na China. Mas acredito que o governo chinês será muito cuidadoso porque quer ser visto como o lado bom da economia global e, quanto mais responder aos Estados Unidos, mais parecerá a vilã.
Se a China também adotar medidas protecionistas, isso poderia acabar numa guerra comercial e afetar o mundo todo?
Sim. É um risco que a gente corre, de haver uma escalada do protecionismo não só nos EUA e na China, mas em outros países também. Isso desaceleraria todo o comércio e os fluxos de investimento. Mas os países estão tentando ser cuidadosos para não desencadear essa guerra. O único interessado nesse tipo de protecionismo são os EUA. Se houver uma escalada protecionista, não serão só os EUA e a China que sairão machucados.
Com as barreiras, os EUA podem perder importância na economia global e a China ganhar espaço?
Acho difícil. A China claramente também tem muitas políticas protecionistas que dificultam que empresas estrangeiras invistam ou vendam seus produtos no país, especialmente bens manufaturados. O país tem uma política industrial cujos objetivos são atualizar a base tecnológica e reduzir as importações de componentes. Então, um terceiro ator, como o Brasil ou a União Europeia, vai olhar para EUA e China e pensar: não gosto do que nenhum deles está fazendo. A China diz ser a favor do sistema global, mas quer apenas que o resto do mundo esteja aberto para suas exportações e investimentos, mas não quer estar aberta para o resto do mundo.
A China se tornou um grande investidor no Brasil, sobretudo em fusões e aquisições. Empresas chinesas compraram ativos num período em que as brasileiras precisavam levantar capital com urgência. Isso poderia mudar em decorrência de uma onda protecionista ou da falta de previsibilidade nas eleições de 2018?
Isso depende apenas das políticas brasileiras. Para a China, a realidade é que há muito dinheiro que precisa ser investido internacionalmente. A única pergunta é se o Brasil está feliz com isso ou se pode criar algum problema (para a entrada de capital estrangeiro). As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.
Foto: Tiago Queiroz/Estadão