ESPORTE INTERNACIONAL
Corridas de rua com cadeira de rodas unem pai e filha no Pará.
Sofia nasceu com uma alteração genética e por isso não fala e nem anda.
Em 13/08/2016 Referência CORREIO CAPIXABA - Redação Multimídia
A vida do gerente comercial Fabiano Santos mudou completamente há sete anos com a chegada da filha caçula, Sofia. O nome vem do grego e significa “sabedoria”, que o pai precisou desenvolver para atender as necessidades especiais da criança: a menina não consegue andar ou falar e, por conta disto, o maranhense de 36 anos que mora em Marabá, sudeste do Pará, criou uma forma de passar mais tempo perto da garota e ajudá-la em seu tratamento através do esporte: com uma cadeira especial, ela acompanha o pai na corrida de rua.
A pequena Sofia nasceu com uma má divisão em um braço no cromossomo cinco e apresenta transtornos de autismo. Quando ela tinha três anos chegou a andar, mas depois de não conseguir estabilidade suficiente e levar muitas quedas, ela parou de levantar.
“Estamos trabalhando para que ela volte a ter confiança. Ela não fala, mas expressa sentimento com as pessoas que ela convive. Quando começa uma música que ela gosta, começa a sorrir”, conta Fabiano, que descobriu que a filha, mesmo sem andar, gosta de correr!
União através do esporte
A ideia de praticar corrida com a filha na cadeira de rodas surgiu há um ano e teve o total apoio da psicopedagoga da Apae, que assiste Sofia. Então Fabiano, que já foi atleta profissional de futebol entre os anos de 1997 e 2002, agarrou essa oportunidade de se exercitar, passar mais tempo perto da filha em um momento só deles, e ajudar no tratamento de Sofia.
“Ela vê coisas diferentes, para que ambientes diferentes passem a fazer parte do mundinho dela. Ter contato com outras pessoas, aglomerações... isso ajuda no raciocínio, para ela prestar mais atenção nas coisas. Tem sido muito importante”, afirma Fabiano.
“Ela não tolera ambientes diferentes, toda vez que a gente sai de casa ela fica agitada. A ideia foi dela se ambientar”, explica Estar Santos, mãe de Sophia e Augusto, 12, filhos de Fabiano.
A primeira corrida oficial que pai e filha participaram juntos foi a Corrida do Círio 2015. "Confesso que tive receio da reação das pessoas, no entanto, os incentivos foram tantos, dos outros atletas e das pessoas que assistiam a corrida, que tive a certeza que estávamos no caminho certo. Pelo quilômetro oito da prova ela começou a sorrir muito e isso me deu um gás a mais para completar”, conta Fabiano.
Desde então a dupla não parou mais, já participou de onze provas, que juntas somam quase 100 km de corrida. Na semana passada, participaram de uma corrida inclusiva organizada pela OAB de Canaã dos Carajás, em que um grupo de corredores organizou uma homenagem a Sofia. Todos usaram camisas com a frase "Amigos de Sofia".
‘Corridas com Sofia’
As descobertas de pai e filha têm sido compartilhadas por Fabiano em um perfil específico nas redes sociais, o “corridas_com_Sofia”. No espaço virtual, Fabiano publica fotos e mensagens de amor à filha e incentivo a outras famílias com crianças especiais.
Foi também na internet que Fabiano foi encontrado pelo “Esquadrão Azul”, um grupo de pais e mães de todo o Brasil, que correm com os filhos especiais. Ele compartilha suas experiências e também aprende com outros pais que praticam corrida há mais tempo.
Para melhorar conforto de Sofia e o desempenho nos treinos e provas, Fabiano mandou fazer, em São Paulo, uma cadeira toda adaptada, com as medidas da criança e dele.
“Tem que ter música no carrinho dela, música gospel, a Sofia é fã de Anjos de Resgate. Ela adora a musiquinha, vento no rosto, quanto mais velocidade, mais ela gosta”, diz satisfeito o pai.
Falta de estrutura
A rotina de Sofia é puxada durante a semana. Além dos treinos com o pai, ela faz fisioterapia, fonoaudiologia e terapia ocupacional na Apae. Os pais trabalham fora para custear as despesas da família e contam com a ajuda de uma babá, Iolanda, que a Sofia adora, para cuidar dela.
Apesar de todos os esforços dos pais, Sofia não tem a estrutura necessária no município. “A cidade não disponibiliza tanta coisa. Aqui não tem escolinha para crianças especiais e a prefeitura não manda uma cuidadora para assistir ela na turma. A Sofia não está frequentando a escola”, lamenta Fabiano, que é natural do Maranhão e mora há três anos em Marabá.
"Meu grande desejo seria esta escolinha e também um tratamento como equoterapia, o que ajudaria a dezenas de pessoas em situação semelhante", diz.
Amor incondicional
A chegada de Sofia foi planejada. Segundo o casal, o filho mais velho Augusto pedia um irmãozinho. Ainda durante a gestação, foi detectado que Sofia seria especial.
“Na gestação a gente viu que ela tinha uma alteração na medida da translucência nucal e corria o risco de nascer com síndrome de Down. Na ultrassom seguinte se descartou, mas foi detectada outra coisa”, lembra Fabiano desse período que ele considera um dos mais difíceis da vida.
“Já temos na família uma criança com síndrome de Down. Eu me preocupei bastante em ter que passar novamente por tudo isso, agora como pai. Entreguei nas mães de Deus. Ela não conseguia mamar, teve que ficar na UTI, sendo alimentada por sonda. Foi um tempo de muita reflexão pra gente”, afirma o pai, que fez muitas viagens para outras cidades em busca de médicos que pudessem diagnosticar Sofia.
O medo do novo foi superado e atualmente Sofia é o xodó da família toda. A esposa de Fabiano, Ester, conta que sempre soube que ele seria um “paizão”.
“Eu via o jeito dele com os sobrinhos, rolando no chão, já sabia que gostava de crianças e imaginava quando a gente tivesse filhos. Ele sempre foi muito apegado aos filhos, gosta de estar com a família. Quando ele viu o pessoal correndo, teve essa ideia de correr com a Sofia”, detalha Ester Santos.
A mãe de Sofia afirma que o amor incondicional dedicado à filha é recíproco. “Eu falo pra ele: ‘meu amor, você não percebe que quando você entra em casa ela fica agitada e não para de te olhar? Ela é apaixonada por você!”.
Fabiano acredita que sua missão na terra seja amar Sofia. “Nossa sintonia, a maneira que ela gosta de me abraçar. Pelos meus filhos, a única coisa que não fiz foi dar de mamar. Dou banho nela, mingau, coloco pra dormir, tudo isso faço por muito gosto. Ela poderá ser uma eterna criança... É a missão que Deus nos deu, quero cuidar dela da melhor maneira possível”, ressalta Fabiano.
A dupla quer realizar pelo menos mais sete corridas até o fim do ano e a família vai tentar conseguir recursos parar participar de duas corridas nacionais: a volta da Pampulha, em Belo Horizonte e a Corrida de São Silvestre, em São Paulo.
Além das corridas, um novo desafio da dupla de pai e filha já está traçado para o futuro: “No futuro quero fazer triátlon com ela, uma competição que envolve natação, ciclismo e corrida. Ela adora água”, revela o pai de Sofia, Fabiano Santos.
g1/Pará