POLÍTICA INTERNACIONAL
Espanha aguarda resultado de votação mais incerta desde a redemocratização
Pesquisas dão a dianteira da corrida eleitoral ao governista Partido Popular.
Em 20/12/2015 Referência CORREIO CAPIXABA - Redação Multimídia
Pela primeira vez em mais de 30 anos, a Espanha foi às urnas neste domingo em uma corrida eleitoral que não girou apenas em torno dos candidatos dos seus dois grandes partidos tradicionais, o Partido Popular (PP) e o Partido Socialista (PSOE).
Duas novas agremiações mostraram, nas pesquisas, ter força para derrubar o bipartidarismo, que muitos viam como parte do DNA político espanhol: o partido Ciudadanos (Cidadãos), que se define como de centro, e o esquerdista Podemos.
É verdade que as pesquisas dão a dianteira da corrida eleitoral ao governista PP. Mas, se os levantamentos estiverem corretos, esse partido deve deixar de ter a maioria absoluta dos 350 membros da Camara dos Deputados e um total de quatro partidos, em vez de dois, terão votações expressivas.
A Espanha tem um sistema de governo parlamentarista, embora o chefe do Executivo seja chamado de presidente.
Para formar governo, um partido precisa ter, em uma primeira votação, o apoio de 176 dos 350 membros da Câmara dos Deputados. Se esse requisito não for alcançado - o que parece ser o caso dessa votação - precisa negociar para conseguir apoio.
Para alguns, o Ciudadanos, que se aliou aos socialistas em Andaluzia e com o PP em Madrid, pode ser um partido chave nesse cenário - ainda que tenha dito que não fará pactos com nenhum dos partidos tradicionais.
Cientistas políticos explicam que o Ciudadanos e o Podemos ganharam força prometendo renovação e combate à corrupção em um contexto de convulsão política e social, que tem em sua raiz a crise econômica espanhola.
Recentemente, movimentos independentistas também ganharam força na Catalunha e, no ano passado, o rei Juan Carlos abdicou.
O PP (de centro direita) e o PSOE (de centro esquerda) vinham se alternando no poder desde 1982 e, juntos, costumavam conseguir até 80% dos votos. “Segundo as pesquisas, dessa vez não conseguirão superar os 50%”, diz Pablo Simón, professor de Ciência Política da Universidade Carlos III, de Madri.
Bipartidarismo
As mudanças no cenário político espanhol se aceleraram em 2014, quando o Podemos, então com poucos meses de existência, ganhou cinco cadeiras nas eleições para o Parlamento Europeu defendendo políticas econômicas anti-austeridade e a luta contra o que seus integrantes chamam de "casta" - a elite política espanhola e europeia.
As eleições municipais e regionais de maio ajudaram a dar fôlego ao Podemos, colocando duas mulheres próximas ao partido à frente das duas principais cidades espanholas: a juíza Manuela Carmena tornou-se prefeita de Madri e a ativista Ada Colau, de Barcelona.
O Podemos é o único desses quatro partidos que apoia a convocação de um referendo sobre a independência catalã – embora se diga contra a proposta de independência em si.
Nestas eleições, seu candidato a presidência foi Pablo Iglesias, de apenas 37 anos. Professor da Universidade Complutense de Madrid e admirador do Papa Francisco, Iglesias tem um discurso que desafia o status quo e um estilo descontraído, evitando o terno e gravata, por exemplo.
"Vamos vencer as eleições, senhores do velho (mundo)", exclamou, em seu último evento de campanha.
'Mudança sensata'
A grande surpresa dessa campanha, porém, foi mesmo o Ciudadanos, que tem representação no Parlamento regional da Catalunha desde 2006 e que, como o Podemos, participa pela primeira vez das eleições gerais espanholas.
Liderado por Albert Rivera, um jovem advogado de 36 anos, o Ciudadanos nasceu com uma bandeira única: a oposição ao nacionalismo catalão.
"A partir de 2012, Rivera decidiu tentar um projeto político de centro para a Espanha", diz Iñaki Ellakuría, jornalista e co-autor de um livro sobre o partido.
Em busca de simpatizantes, ele percorreu o país e, como Iglesias, participou de inúmeros debates em programas de TV sobre política, bastante populares na Espanha.
No plano econômico, Ciudadanos se define como um partido de ideologia liberal. Além disso, defende um pacto nacional para a educação.
Rivera define seu projeto político como o de uma "mudança sensata". "Ele propõe uma reforma, não uma revolução", diz Ellakuría.
Crescimento econômico
Simón explica que, apesar do fortalecimento dessas novas forças políticas, o PP continua a ter um apoio expressivo em função de ter conseguido explorar bem a recuperação econômica em sua campanha.
A Espanha deve fechar o ano com um crescimento de 3,1% do PIB segundo analistas, cifra que supera a da maioria dos países da região. E apesar de o desemprego ainda ser de 21%, já houve momentos no passado recente em que chegou a 27%.
Além disso, pela primeira vez desde o início da crise, os espanhóis que estão otimistas sobre o futuro da economia do país superam em número os pessimistas.
Em sua campanha, o atual presidente Mariano Rajoy, de 60 anos, candidato a reeleição, prometeu criar dois milhões de postos de trabalho e se apresentou como o único com experiência e pragmatismo suficientes para manter o país no caminho do crescimento.
"É muito difícil que o partido do governo perca as eleições se a economia está crescendo", diz Simón.
Rajoy também manteve certa distância de seus rivais na campanha, participando apenas de um dos três debates eleitorais organizados entre os candidatos - e no qual debateu apenas com o candidato do PSOE, Pedro Sánchez, de 43 anos.
Socialistas
Sánchez foi a aposta dos socialistas para deixar para trás o duro golpe sofrido pelo partido em 2011, quando o PSOE obteve os piores resultados eleitorais da sua história.
Na época, muitos espanhóis culpavam o presidente José Luis Rodríguez Zapatero por adotar políticas ineficientes contra a crise econômica.
Para ganhar votos, Sánchez propôs uma reforma constitucional para "melhorar a qualidade da democracia do país" e "avançar na descentralização do Estado'. Também defendeu que a única opção da Espanha é a "mudança possível" e procurou lançar luz sobre os casos de corrupção no PP.
Recentemente, o ex-tesoureiro do partido governista Luis Bárcenas confessou ter administrado um caixa dois, distribuindo propinas e recolhendo doações ilegais de empresas. Rajoy nega qualquer envolvimento no esquema.
"Se o senhor ganhar, o custo para a democracia (espanhola) será enorme, porque o presidente deve ser uma pessoa decente e o senhor não é", disse Sánchez a Rajoy durante o debate, fazendo menção ao escândalo.
Fonte:G1