NEGÓCIOS
Esta é a vez das companhias aéreas de baixo custo
Frederico Pedreira, da Avianca, aposta na operação "Low cost" mas defende regras iguais.
Em 16/11/2018 Referência CORREIO CAPIXABA - Redação Multimídia
O empresário alemão-chileno Holger Paulmann é um viajante por essência. Como filho de Jüngen Paulmann (1934-2014), fundador da companhia Sky Airlines, e sobrinho do bilionário Horst Paulmann, dono e presidente da gigante varejista Cencosud, ele dedicou grande parte do seu tempo a voar pelo mundo para cuidar dos negócios da família nas últimas duas décadas.
Desde 2014, no entanto, ao assumir o comando da empresa área depois da morte do pai, Holger tem repetido à exaustão uma única rota: a ponte-aérea Chile-Brasil. “Tenho vindo para estudar o mercado brasileiro há muitos anos e, cada vez que visito o País, fico mais empolgado com o imenso potencial de oportunidades de negócios, principalmente para o setor aéreo”, afirmou o empresário à reportagem. A euforia de Holger não se justificaria pela atual configuração do mercado nacional, concentrado nas mãos de quatro grandes companhias – Latam, Gol, Azul e Avianca.
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Nos últimos anos, ainda que dominando os céus brasileiros, elas colecionaram prejuízos e um extenso histórico de conflitos regulatórios, multas de órgãos de defesa do consumidor e ações judiciais. A empolgação de Holger, na verdade, se deve ao horizonte das passagens hiper-baratas, as chamadas low cost, na qual a Sky é uma protagonista. Há exatamente um mês, a empresa recebeu sinal verde da Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) para operar rotas internacionais. Na semana passada, a aérea chilena, principal rival da compatriota Latam no seu país de origem, começou a voar para o Rio de Janeiro, e iniciará em 2019 as rotas para Florianópolis e São Paulo. Detalhe: o bilhete custa US$ 49, menos de R$ 200, mais em conta do que uma passagem de ônibus de São Paulo a Porto Alegre.
“Percebi que os nossos competidores no Brasil oferecem preços extremamente elevados e embutem custos de serviços que, em muitos casos, não são utilizados pela maioria”, diz o presidente da Sky.
Para conseguir tal façanha e fechar a conta no final do mês, Paulmann conta que a sua operação possui um formato enxuto. Os clientes têm direito apenas a água, e qualquer outra demanda é cobrada à parte. Nada muito diferente do que já acontece nas companhias brasileiras. Além disso, as 19 aeronaves da frota não podem, segundo ele, ficar mais do que 30 minutos em solo, aumentando a produtividade da operação e diluindo os custos fixos da companhia, como as equipes de aeroporto. “Estou muito otimista com as nossas perspectivas para o Brasil, tanto é que vamos investir US$ 3 bilhões nos próximos 12 anos em compra de novos aviões e consolidação da nossa operação.”
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A low cost chilena, se depender das concorrentes, não voará sozinha em céu de brigadeiro. A norueguesa Norwegian Airlines, uma das principais no segmento de baixo custo da Europa, também recebeu autorização da Anac e iniciou seus voos regulares entre Londres e Rio de Janeiro, assim como a argentina Avian, do grupo colombiano Avianca, fará com a rota Buenos Aires-São Paulo. A também argentina Flybondi afirma que está pronta para protocolar, nos próximos dias, seu processo de documentação junto à Anac, depois de ter recebido o aval do governo argentino.
A Joon, do grupo franco-holandês Air France-KLM, já iniciou seus três voos semanais ligando Fortaleza a Paris e, em breve, a Amsterdam. A francesa Aigle Azur, que não é exatamente uma low cost mas adota uma agressiva política de preços promocionais, também começou a operar quatro voos semanais no trecho Paris-Campinas (SP), em codeshare (acordo de compartilhamento de voos) com a brasileira Azul. “O aumento da concorrência será benéfico para os usuários e ajudará as companhias a ser mais eficientes e competitivas”, afirmou o professor de Transporte Aéreo da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Respício do Espírito Santo.
No comando da chilena Sky Airlines, Holger Paulmann enxerga um imenso potencial para as áreas de baixo custo. Ele vai investir US$ 3 bilhões
Apesar da corrida das estrangeiras por autorizações de voos nas últimas semanas, os céus começaram a ser abertos para as low cost no Brasil em dezembro de 2016, com a Resolução 400. O texto prevê, por exemplo, a desregulamentação da bagagem e permite às companhias cobrar pelo despacho das malas. Para a Anac, a alteração nas regras igualou o País aos padrões internacionais. No entanto, no quesito concorrência, o desembarque das novas companhias ainda deve gerar faíscas com as empresas brasileiras. A Anac tem adotado uma postura de total desregulamentação do setor, abrindo caminho para o acirramento da concorrência. “Com mais players no mercado, teremos preços menores, serviços melhores e um processo de migração de passageiros de ônibus para os aviões, um fenômeno que tem acontecido de forma intensa nos últimos dez anos”, afirmou o superintendente da Anac, Ricardo Cantanant.
Essa avaliação é compartilhada pelo ministro do Turismo, Vinicius Lummertz. “O governo brasileiro entende que já passou da hora de transformar a conectividade aérea em solução, e não mantê-la como dificuldade para o turista”, afirma. “Quase 75% da população quer mais opções de empresas aéreas no País, portanto essa medida é de total interesse dos brasileiros.” Há ainda o argumento de que a chegada de novas competidoras vai atrair investimentos em aeroportos, incentivar a criação de novas rotas regionais e desafogar os maiores e abarrotados terminais do País, como os de Cumbica e Congonhas, em São Paulo.
Frederico Pedreira, da Avianca, aposta na operação ‘Low cost’ mas defende regras iguais
Por outro lado, há quem enxergue turbulências no horizonte com a abertura do mercado sem uniformização das regras do jogo.
O presidente da Associação Brasileira das Empresas Aéreas (Abear), Eduardo Sanovicz, que representa as companhias que hoje dominam o mercado, não concedeu entrevista, mas a entidade divulgou uma nota em que defende a menor interferência do governo e sugere que os custos operacionais no Brasil deixam as empresas nacionais em situação de desvantagem na concorrência com rivais estrangeiras. “Esse reforço da competitividade passa pela equalização dos custos existentes por aqui, que são superiores à média global”, informou a Abear. “A desregulamentação do transporte de bagagens, a exemplo do que já se praticava no restante do mundo, tem amparado a retomada do crescimento do setor, após a crise econômica, abrindo espaço para novos modelos de negócio, renovando, inclusive, o interesse de estrangeiras.”
A burocracia e o peso dos impostos têm sido, indiscutivelmente, fontes de problemas para o setor. Pelos cálculos de Associação Internacional de Transporte Aéreo (Iata), da Associação de Transporte Aéreo da América Latina e Caribe (Alta) e da Abear, a aviação no Brasil teve, em 2017, um custo extra de R$ 2,7 bilhões com combustível em relação ao que haveria caso o País adotasse uma tributação semelhante à média dos países vizinhos. “A Avianca é a favor da concorrência, no entanto, acreditamos que para ser uma competição equilibrada, as empresas brasileiras e internacionais têm de ser submetidas às mesmas regras”, disse à DINHEIRO o presidente da Avianca Brasil, Frederico Pedreira, que tem ajudado a subsidiária argentina da holding a estruturar sua operação low cost. “A competição é importante para o mercado e oferece aos consumidores novas opções.”
A batalha entre as companhias aéreas deve ficar ainda mais intensa. Além da chegada das low cost, o Ministério do Turismo está angariando forças no Congresso para a aprovação PL 2724/15. O projeto deverá ser votado ainda neste ano e amplia de 20% para 100% a possibilidade de participação do capital estrangeiro nas aéreas no Brasil. Com isso, a lei permitirá que companhias de fora possam controlar empresas locais e operar voos domésticos, não só rotas as internacionais. A batalha promete.
Um voo de R$ 78 mil
Suíte privativa, menu de chef estrelado e garrafas de Château Margaux 1998 estão entre as mordomias resevadas aos passageiros da primeira classe nas aéreas “high cost”
Enquanto companhias aéreas de baixo custo aterrissam no Brasil, outras oferecem serviços exclusivos e nada baratos na primeira classe. Aos consumidores dispostos a pagar mais – muito mais —, há todo tipo de mordomias. Uma das empresas que atuam no Brasil e dispõem desse tipo de serviço é a Emirates. No A380, aeronave que faz o trecho de São Paulo e Rio de Janeiro a Dubai, os passageiros da primeira classe têm direito a bar lounge, suítes privativas (foto), menu assinado por chefs estrelados, vinhos finos como o Château Margaux 1998 (cerca de R$ 8.000 a garrafa), banheiro com chuveiro, piso aquecido e produtos da grife Bulgari. Há até um pijama de tecido tecnológico, com microcápsulas de hidratante, para que sua pele seja hidratada enquanto você dorme.
Tudo isso tem um preço. Alto. Na classe econômica, uma passagem de ida e volta de São Paulo a Dubai custa R$ 5.500. Para passar as 15 horas do vôo na primeira classe, o viajante paga R$ 78.000, o suficiente para comprar dois carros populares. “É um produto caro, sim, de nicho”, diz Stephane Perard, country manager da Emirates no Brasil. Dos 506 lugares do A380, apenas 14 – menos de 3% — são reservados para as suítes da primeira classe. “Mas há público para isso no Brasil. Caso contrário, não ofereceríamos o serviço”. Hoje, a companhia árabe realiza 19 vôos semanais no País: 12 a partir de São Paulo e 7 do Rio.
O luxo também está presente nos voos da Lufthansa. Na primeira classe, a companhia alemã oferece poltronas que reclinam 180 graus, pijama, par de chinelos e cardápio exclusivo. No serviço à la carte, os pratos são preparados individualmente e servidos em peças de porcelana. Com dois voos diários para Frankfurt, a partir de São Paulo e do Rio de Janeiro, a passagem na primeira classe, ida e volta, fica em torno de R$ 30 mil, mais de sete vezes a tarifa econômica, que custa cerca de R$ 4 mil. A espanhola Air Europa, com voos diários de São Paulo para Madri, três vôos semanais de Salvador e dois do Recife, também opera no “high cost”.
Além de poltronas que se transformam em cama e kit de mimos, os passageiros têm menu elaborado por dois dos maiores chefs do mundo: Martin Berasategui – 8 estrelas Michelin – e Paco Torreblanca, especialista em sobremesas. Do cardápio da primeira classe constam delícias como o taco de bacalhau grelhado, com molho cítrico e ervas. O viajante paga cerca de R$ 7 mil no voo de São Paulo a Madri – na econômica, o preço cai para R$ 2.800. São tantas mordomias aos viajantes VIP que alguns não precisam nem se preocupar com o traslado até o aeroporto. Na Emirates, o passageiro da primeira classe não apenas voa com todo conforto. Ele tem direito a carro com motorista.