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Mulheres são maioria no trabalho da reciclagem em Vitória

70% das pessoas que trabalham na coleta de materiais recicláveis, no Brasil, são mulheres.

Em 09/03/2021 Referência CORREIO CAPIXABA - Redação Multimídia

Foto: Divulgação/Ascamare

Estudo do Movimento Nacional de Catadores de Materiais Recicláveis revela que elas são quase 70% da força de trabalho na coleta, triagem, comercialização e organização dos trabalhadores da área. Em Vitória elas comandam as organizações e o trabalho do setor.

Estamos no período de comemoração do Dia Internacional da Mulher, 08 de março. Momento de refletir, debater e conhecer a realidade das mulheres e do universo que as cerca. E a sustentabilidade ambiental da cidade e do planeta entra neste contexto, principalmente quando o assunto é reciclagem.

Você sabia que 70% das pessoas que trabalham na coleta, triagem e comercialização de materiais recicláveis, no Brasil, são mulheres? É o que revela um estudo do Movimento Nacional de Catadores de Materiais Recicláveis (MNCR). Elas estão em todas frentes deste trabalho, desde a coleta nas ruas até e organização de trabalhadores e trabalhadoras da área.

Confirmar o estudo do MNCR é fácil. Basta fazer uma visita às associações de catadores de materiais recicláveis da cidade, onde a maioria é formada por mulheres que desempenham quase todas as funções, das mais leves às mais pesadas, das mais simples às mais complexas.

As três associações que se reúnem no projeto Catadores São Educadores - Associação de Catadores de Materiais Recicláveis de Vitória (Ascamare), Associação de Catadores de Materiais Recicláveis da Ilha de Vitória (Amariv) e Associação de Catadores de Materiais Recicláveis do Município de Vitória (Amarv), são geridas por mulheres que arregaçam as mangas e vão à luta por suas organizações, pelos associados, e como elas próprias afirmam: “pela cidade e por suas famílias”.

Histórias de Vida

Na Amariv a presidência e a vice-presidência são ocupadas por mulheres. Vera Lúcia Silva dos Santos, 66, é a presidente. Seu jeito manso e de fala baixa, quase sempre sorrindo, esconde a força de uma mulher que lutou muito para criar os cinco filhos. Ela conta que trabalhou no mercado formal até os 40 anos. Depois disso, as oportunidades ficaram escassas.

Para sobreviver aprendeu a fazer artesanato e passou a recolher latinhas de alumínio nas ruas.

“Para viver não tinha outro jeito”, afirma. Até que ela foi na associação de catadores pedir uma oportunidade de trabalho. Foi aceita e lá está há oito anos.

Vera Lúcia diz que isso mudou a sua vida. “Eu não conhecia os materiais que coletava, o valor. Aqui é uma escola, um aprendizado constante, e isso melhorou muito a minha vida” afirma. Ela diz que morava numa casa de tábuas, mas depois que entrou na Associação pode construir a própria casa de alvernaria, melhorando-a a cada dia.

“Aqui o lixo é luxo, tudo tem valor. Isso mudou meu jeito de olhar a natureza pois hoje eu tenho conhecimento”.

E o conhecimento adquirido na Associação é replicado em casa.

“Lá em casa passamos a separar tudo direitinho. Ninguém mistura nada” diz Vera.

Ela afirma que na Amariv as mulheres estão à frente de quase tudo, mas os homens colaboram e o trabalho é executado em harmonia.

“Por  isso a tarefa de ser presidente não é tão difícil, discutimos juntos todas as decisões”, afirma.

Outro braço feminino forte na Amarv é da vice-presidente Ana Lucia Oliveira dos Santos, 48, mãe de sete filhos. Essa mineira veio para Vitória cuidar da saúde de um dos filhos que estava doente e ficou de vez. Ela diz que foi para as ruas coletar materiais recicláveis por necessidade. Trabalhou com uma carroça doada por uma amiga para sustentar os filhos.

“Com este trabalho nunca deixei faltar nada para os meus filhos que cresceram e tiveram uma vida digna. Tenho orgulho de dizer que trabalho com o lixo em Vitória. Isso é luxo. Entrei por necessidade, mas descobri que com isso estava protegendo toda a cidade, pois o que retiro das ruas evita muitos problemas”, afirma.

Ana Lúcia que enfrentou dificuldades no relacionamento com o pai de seus filhos, diz que orienta muitas mulheres que enfrentam problemas semelhantes aos seus.

“Aconselho as mulheres a se empoderar, a ter coragem, a se cuidar, e nunca  se submeter  a situações de maus tratos por dependência financeira ou medo”, disse.

A gente se junta e sabe da ferida uma da outra, se cuida, ergue a cabeça e se valoriza. Com isso a gente conquista o reconhecimento de outras pessoas, sem submissão.

“Eu viajei muito, ouvi as dores de muitas mulheres do Brasil e do mundo. Isso me deu coragem e força para a caminhada”.

Dedicação à reciclagem

Na Amarv encontramos outra mulher no comando da Associação. É a presidente Maria Aparecida da Silva Pereira, 57, que tem toda a sua história de vida envolvida com a reciclagem.  Ela tem cinco filhos e 12 netos e toda a família trabalha com a coleta, separação e venda de materiais recicláveis.

Tudo começou com a sua mãe, Dona Geraldina da Silva Coutinho, 77 anos. Para criar os 10 filhos no Rio de Janeiro, Dona Geraldina foi trabalhar num lixão.  E de lá pra cá nunca mais parou. Aparecida cresceu neste meio, coletou materiais na rua, puxou carrinho na rua e enfrentou muito perigo e preconceito.

Para ir trabalhar nas ruas, ela deixava muitas vezes os filhos sozinhos em casa. Eu olhava pra traz e saia chorando, mas era preciso. Graças a Deus deu tudo certo..

“Para a mulher sempre é muito difícil pois é um trabalho pesado e onde falta respeito à mulher”, diz. Aparecida fez parte do grupo que organizou a Amariv, mas depois deixou o grupo e fundou a Amarv. Ela acredita que a presença forte das mulheres neste trabalho é pela persistência e determinação femininas. “A gente não desiste e coloca a coisa para andar”, afirma.

Ela afirma que com a organização dos catadores em associações muita coisa melhorou, mas ainda há resistências. “Muitos homens que vem trabalhar aqui não aceitam receber orientações de mulher, ficam pouco tempo, mas outros compreendem que a proposta aqui é somar”, finaliza.

Força feminina

A juventude de Amanda Paula Cabral Salles, 26, se traduz em muita energia e disposição para o trabalho da diretora financeira da Ascamare. Diferente das demais, ela tem apenas três anos de trabalho na reciclagem, o que não a impediu de aprender rapidamente tudo sobre o assunto.

“Eu sou responsável pela parte financeira da Ascamare, elaboro o plano anual de trabalho, mas também faço as dinâmicas de grupo, dirijo os carros para a coleta de rua, enfim, ajudo a fazer tudo o que tiver para fazer”, afirma.

Amanda é outra mineira que veio para o Espírito Santo com um convite para trabalhar diretamente com a área da reciclagem e aprendeu tudo rapidamente. “A reciclagem é uma porta que se abre para novas conquistas e que nos traz um leque de conhecimentos grande”, afirma. Ela diz que ainda tem muito o que estudar e aprender na área.

A Ascamare tem 22 associados, a maioria, 14, são mulheres. “Aqui é uma  democracia, todas as decisões são tomadas de forma coletiva. Os homens entendem o nosso papel, não há disputa de gênero. Assim não é preciso exercer a autoridade”, afirma.                                 

A experiência do projeto

O projeto Catadores é uma experiência nova em busca de promover sustentabilidade na cidade de Vitória aliando a defesa do meio ambiente, mas também inclusão social e econômica dos catadores  e catadoras de materiais recicláveis e suas organizações.

Iniciado em 2019, o projeto alia ações ambientais, ampliando a coleta e destinação adequada de resíduos recicláveis, de educação ambiental e consumo consciente com palestras e eventos por toda a cidade, com a melhoria da renda dos catadores e inclusão de catadores autônomos nas organizações do segmento.

Entre os resultados positivos alcançados com o projeto foi a contribuição para a elevação do índice de coleta de materiais recicláveis pela cidade que era de 2,6% e no final do ano atingiu o índice de 3%. Uma conquista alcançada através da prática da coleta direta de matérias por parcerias formadas pelas associações com fontes geradoras de resíduos recicláveis, como condomínios, o comércio e instituições públicas.

Esse aumento no percentual de recolhimento de resíduos recicláveis também contribuiu para elevar a renda dos catadores nas associações do segmento, e estas chegaram a pagar o salário mínio integral para seus associados no final de 2019. Essa meta não foi atingida em 2020 em virtude da pandemia do corona vírus que reduziu a quantidade de materiais nas associações.

“Além desta conquista também ouve uma aproximação grande das organizações dos catadores com os munícipes através de uma série de palestras sobre educação ambiental, consumo consciente e reciclagem, o que contribuiu imensamente para o processo de conscientização da população sobre esses temas e sobre os próprios catadores que são grandes agentes ambientais das cidades”, declarou Leonora Mol, coordenadora do Projeto.

É desenvolvido pela Associação Ateliê de Ideias através do Termo de Fomento 212/2018 celebrado em parceria com a Secretaria Municipal de Cidadania e Direitos Humanos e Trabalho e recursos do Procon Municipal,  em parceira com as associações Ascamare, Amariv e Amarv.

Saiba mais 

Ascamare – Associação de Catadores de Materiais Recicláveis de Vitória – Rua Construtor Camio Gianordoli, 117 – Consolação – Vitória – ES (27) 99926-0560
Facebook - Ascamare Vitória
Amariv- R. Elvira Zilio, 269 - Mário Cypreste, Vitória - ES, 29026-080
(27) 99518-0951 - Facebook – Amariv Vitória
Amarv—Rua Joaquim Leopoldino Lopes, 580—Consolação – Vitória - ES (27) 997927980-  Facebook – Amarv Vitória.  (Por Marina Filetti)

 

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