POLÍTICA NACIONAL

Para Lula, base aliada não obteve "vantagens indevidas" na Petrobras.

Ex-presidente prestou depoimento à PF na quarta na condição de informante.

Em 19/12/2015 Referência CORREIO CAPIXABA - Redação Multimídia

Em depoimento à Polícia Federal (PF), o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva disse na última quarta-feira (16) que não teve conhecimento de atos de corrupção na Petrobras ao longo dos oito anos em que governou o Brasil, entre 2003 e 2010. O petista também afirmou aos policiais não crer que os principais partidos de sua base aliada tenham, por meio de seus líderes, obtido vantagens indevidas em contratos das diretorias da petroleira.

Lula prestou depoimento, em Brasília, na condição de informante, no principal inquérito da Lava Jato, que investiga o envolvimento de políticos no esquema de corrupção que atuava na estatal do petróleo. O petista não é investigado pela operação policial.

"Indagado se tinha conhecimento dos eventos de corrupção ocorridos na Petrobras e desvelados pela Operação Lava Jato, o declarante afirma que não tinha conhecimento dos mesmos. [...] Que não crê que os principais partidos da base aliada do governo tenham, através de suas principais lideranças, obtido vantagens indevidas a partir dos contratos das diversas diretorias da Petrobras", diz trecho do depoimento de nove páginas do petista.

O ex-presidente também foi indagado pelos delegados da PF a explicar ao que ele atribuia o fato de integrantes de seu governo serem alvo de inquéritos no Supremo Tribunal Federal (STF) por suspeita de envolvimento nas irregularidades cometidas na Petrobras.

Ao responder, o ex-presidente listou três motivos, entre os quais o que ele classificou de "processo de criminalização do PT".

Ele ainda atribuiu as investigações a um processo de "transparência e aprimoramento dos órgãos de fiscalização e controle" durante os governos petistas, especialmente, a Polícia Federal, o Ministério Público Federal e a Controladoria-Geral da União. Por fim, Lula ressaltou a existência de uma imprensa livre no país como um dos fatores que permitiram a descoberta das irregularidades.

Amigo
Luiz Inácio Lula da Silva declarou no depoimento à Polícia Federal que conheceu José Carlos Bumlai na campanha presidencial de 2002, quando gravou cenas de sua propaganda eleitoral em uma das fazendas do pecuarista investigado pela Lava Jato.

Ele admitiu que é amigo de Bumlai e disse que recebeu o pecuarista algumas vezes em Brasília na época em que presidiu o país. Lula, porém, disse achar que o amigo nunca se hospedou no Palácio da Alvorada, residência oficial da Presidência. Conforme o relato do petista, o pecuarista costumava se hospedar na Granja do Torto, casa de campo da Presidência da República, e em hotéis da capital federal.

O ex-presidente comentou que indicou Bumlai para o Conselho de Desenvolvimento Economico e Social de seu governo, órgão formado por mais de cem empresários indicados por diversos segmentos da sociedade. Segundo Lula, o pecuarista entrou no colegiado como um dos representantes do setor agrícola.

Empréstimos para o PT
Ao longo do depoimento, Lula foi questionado pelos delegados sobre os empréstimos tomados por José Carlos Bumlai junto ao banco Schahin. O Ministério Público afirma que o pecuarista utilizou contratos firmados na Petrobras para quitar o dinheiro que pegou emprestado com a instituição financeira.

O principal empréstimo em investigação pela Lava Jato era de R$ 12 milhões e teve o valor elevado para R$ 21 milhões devido aos acréscimos. A dívida, de acordo com o MPF, foi perdoada, e a irregularidade foi mascarada com uma falsa quitação no valor inicial do empréstimo.

Em troca dos empréstimos, afirmam os investigadores, empresas do grupo Schahin conquistaram, sem licitação, o contrato de operação do navio-sonda Vitória 10.000.

À PF, o ex-presidente respondeu que não solicitou que Bumlai contratasse emprestimos em seu nome para repassar ao PT. De acordo com Lula, os dois "jamais" trataram sobre "dinheiro ou valores". O petista afirmou que soube dos "boatos" dos empréstimos tomados pelo amigo por meio da imprensa.

Lula assegurou aos policiais que "não tomou conhecimento" do processo de contratação, por parte da Petrobras, da empresa operadora do Vitória 10.000. Além disso, ele ressaltou que não recebeu de Bumlai qualquer pedido para interferisse no processo de escolha para beneficiar o Grupo Schahin.

Ele ainda enfatizou que "nunca" solicitou que o ex-tesoureiro do PT Delúbio Soares, condenado e preso no processo do mensalão por envolvimento no esquema de compra de votos no Congresso Nacional, contratasse empréstimos para o PT.

Nomeação de diretores
No depoimento à PF, Lula também disse que, no anos em que comandou o Palácio do Planalto, não se envolveu nas negociações que resultaram nas indicações de Renato Duque, Nestor Cerveró e Paulo Roberto Costa para a diretoria da Petrobras. Os três foram presos e são réus em processos da Lava Jato acusados de receberem propinas de fornecedores da estatal do petróleo para facilitar o superfaturamento de contratos.

Segundo o ex-presidente, as indicações para o governo eram feitas pelos titulares dos ministérios e passavam pelo crivo final da Casa Civil, à época chefiada pelo ex-ministro José Dirceu, que está preso por suspeita de envolvimento no esquema de corrupção.

"[Lula disse] que não sabe se foi o PT ou outro partido político que indicou Renato Duque para assumir a Diretoria de Serviços; [Lula disse também] que não conhecia Renato Duque e que não participou do processo de escolha do nome de Renato Duque", diz trecho do depoimento de Lula.

Em meio ao depoimento, Lula foi perguntado sobre quais diretores da Petrobras foram indicados pelo PT. Segundo o ex-presidente, "talvez", Renato Duque tenha sido indicado pela legenda.

O Ministério Público Federal acusa o ex-diretor de Serviços da Petrobras de ter recebido propina do esquema de corrupção que atuava na estatal e dividi-la com o PT.

Conforme os investigadores, Duque recebeu dinheiro desviado da estatal por meio de contratos superfaturados com construtoras que prestavam serviços à petroleira.

Em setembro deste ano, ao participar de uma acareação organizada pela CPI da Petrobras, Renato Duque disse que o ex-consultor da Toyo Seal Augusto Mendonça Neto, um dos delatores da Lava Jato, é um "mentiroso" por ter dito que ele recebia propina.

Em relação a Nestor Cerveró, o ex-presidente declarou em seu depoimento que o ex-diretor da área internacional da Petrobras era um funcionário de carreira da empresa e que o processo de escolha dos nomes dos diretores não contava com a participação dele.

O líder petista negou que tenha tratado diretamente sobre a substituição de Cerveró por Jorge Zelada na diretoria intemacional da petroleira. Ele disse, entretanto, que sabia que Zelada era uma "reivindicação" do PMDB.

Lula também afirmou que não recebeu de Bumlai qualquer pedido para que Cerveró fosse mantido à frente da diretoria internacional. De acordo com o petista, sua relação com o pecuarista "não permitia tal pedido".

Em outro trecho do depoimento, ele também negou que tenha tratado com José Carlos Bumlai sobre a indicação de Nestor Cerveró para a Diretoria Financeira da BR Distribuidora, subsidiária da Petrobras. Aos policiais, o ex-presidente disse achar que a indicação de Cerveró para o alto escalão da BR Distribuidora "também foi uma solicitação do PMDB".

Costa e Barusco
O petista ainda falou aos policiais sobre a indicação de Paulo Roberto Costa para a Diretoria de Refino e Abastecimento da Petrobras. Lula reconheceu que o ex-dirigente, que também era funcionário de carreira da companhia de petróleo, foi indicado pelo Partido Progressista (PP) para o cargo de alto escalão.

No entanto, o ex-presidente disse que "nunca se sentiu pressionado" pelo PP para nomeá-lo para a diretoria.

Lula destacou aos delegados que não acredita na denúncia de Costa de que 2% do valor dos contratos firmados pela Diretoria de Refino e Abastecimento eram repassados para o PT por meio do ex-tesoureiro da legenda João Vaccari Neto. O ex-diretor detalhou como funcionava a divisão da propina em seu acordo de delação premiada.

Para o ex-presidente, Paulo Roberto Costa fez a acusação envolvendo o Partido dos Trabalhadores para obter a redução de sua pena nos processos da Lava Jato.

Ele também negou conhecer o ex-gerente da Petrobras Pedro Barusco, que trabalhava ao lado de Renato Duque e se tornou um dos delatores do esquema de corrupção da petroleira. Ao Ministério Público, Barusco relatou que parte do valor pago nos contratos da Diretoria de Serviços, comandada por Duque, era desviada para o PT.

Neste caso, Lula também disse não acreditar na versão do ex-gerente e, mais uma vez, atribuiu a denúncia à tentativa de obter os benefícios da delação premiada.

O que mais Lula disse à PF:
- O ex-presidente também afirmou aos policiais federais que não soube, não autorizou e não acredita no repasse de recursos suspeitos para João Vaccari Neto e para o ex-tesoureiro de sua campanha à Presidência José de Filippi. Ele ressaltou que não acredita que Filippi tenha recebido dinheiro ilícito da Queiroz Galvão.

- Lula disse que é amigo de Vaccari e que o conheceu na época em que o ex-tesoureiro do PT presidia o Sindicato dos Bancários de São Paulo. O ex-presidente ressaltou que sua relação com Vaccari no PT foi "pequena", na medida em que ele deixou o comando da sigla em 1996. Segundo o ex-chefe do Executivo federal, a direção do PT relatou a ele que Vaccari fez um excelente trabalho à frente da Tesouraria da sigla.

- O petista afirmou à PF que a indicação de José Eduardo Dutra para a presidência da Petrobras foi uma decisão pessoal dele. Ele justificou que, além de ter conhecimento do setor petroquímico, Dutra – que morreu em outubro deste ano – era geólogo e tinha envolvimento com o movimento sindical.

- Lula também confirmou no depoimento que foi dele a decisão de nomear José Sérgio Gabrielli para o comando da estatal do petróleo.

- Lula garantiu à PF que não tinha "amizade" com o dono da construtora UTC, Ricardo Pessoa, um dos delatores da Lava Jato. Ele disse que não lembra quando conheceu o empreiteiro, mas contou que, em 2011, se reuniu pela primeira vez reservadamente com Pessoa na sede do Instituto Lula, em São Paulo. O delator da Lava Jato, de acordo com ele, foi à entidade para convidá-lo a dar uma palestra na UTC.

- O ex-presidente disse ainda não acreditar que Ricardo Pessoa tenha repassado dinheiro ilícito para Vaccari, como o empreiteiro contou ao Ministério Público em depoimentos de seu acordo de delação premiada. Novamente, Lula atribuiu as declarações a uma tentativa de reduzir a pena.

Fonte:G1