SAÚDE

Pesquisa acha 10 mil fungos e bactérias em fones de ouvido

Eles podem causar coceira, micoses e até perda de audição e meningite.

Em 15/08/2017 Referência CORREIO CAPIXABA - Redação Multimídia

Uma pesquisa realizada com fones de ouvido e headfones constatou a contaminação por aproximadamente 10 mil fungos e bactérias, que podem causar de coceiras e micoses até infecções mais graves, incluindo risco de perda de audição. A análise, feita pela faculdade de biomedicina da Devry Metrocamp, em Campinas (SP), considerou a falta de higiene correta dos objetos, e os pesquisadores alertam para os problemas no compartilhamento de fones.

Segundo a bióloga, professora e coordenadora do estudo, Rosana Siqueira, durante três meses foram avaliados 40 fones, sendo 30 do modelo mais comum (que se encaixa na cavidade da orelha) e outros 10 headfones. Os aparelhos analisados pertenciam a jovens e adultos, que costumavam emprestar a outras pessoas e não tinham, na maioria, o hábito de higienizá-los.

Em 87% dos fones foi encontrada contaminação em maior quantidade, inclusive da bactéria Staphylococcus aureus, responsável por infecções de pele - como furúnculo, impetigo -, abcessos, e também infecções das vias aéreas superiores, entre elas, otites e sinusites. Em alguns casos, pode levar até a meningite.

"Se os micro-organismos invadirem a região mais interna do ouvido, podem atingir os nervos auditivos, e isso pode afetar o sistema nervoso central e pode ocasionar, em alguns casos, a meningite. Tem que tomar cuidado, principalmente as crianças, que o sistema imunológico ainda está em formação, e idosos também. As pessoas que já tenham uma predisposição", alerta a pesquisadora.

Entre os fungos, o Candida ssp, que também pode provocar infecções oportunistas no organismo de pessoas com a imunidade baixa, também preocupou os pesquisadores. Dependendo do sistema de defesa de cada pessoa, os micro-organismos podem chegar em órgãos importantes do ouvido e afetar a anatomia.

"Afetando a anatomia, você pode ter problemas de audição e até mesmo a labirintite", completa a pesquisadora.

"Fiquei assustado com os fungos. É um micro-organismo que tem o desenvolvimento lento e, quando aparece, é muito difícil de tratar. Causa otomicose. A pessoa que usa muito antibiótico, e fica propensa a isso, não consegue tratar com antibiótico, precisa tratar com antimicótico", afirma o pesquisador e aluno de biomedicina Márcio José Evangelista Júnior.

No caso dos headfones, todos os analisados tinham a presença de Staphylococcus aureus, mas em menor quantidade, o que torna seu uso um pouco mais seguro, segundo a pesquisadora. Esse modelo fica em contato com a parte externa da orelha, e também com a pele e o cabelo, ambiente que também favorece o crescimento de fungos e bactérias.

"Mesmo não tendo contato com a cera, está em contato com outras partes. As partes externas da orelha também têm contaminação. [...] A forma de contaminação diminui, mas não deixa ele isento de ocasionar esses problemas", comenta Rosana.

A solução para afastar os riscos é a limpeza adequada dos dispositivos.

A pesquisadora ressalta que ouvir o som muito alto nos fones também prejudica e altera a estrutura auricular, podendo causar também problemas de saúde, como a perda de audição.

Não compartilhe

O compartilhamento dos fones com outras pessoas não é indicado porque, além dos micro-organismos, a flora auditiva varia de pessoa pra pessoa e há o risco de pegar uma infecção.

"Se é individual, é seu. Evite emprestar. Porque a sua flora é diferente da flora da outra pessoa. É o que a gente chama de contaminação cruzada. A predisposição de uma pessoa é diferente da outra", afirma Rosana.

Cera ajuda ou atrapalha?

Segundo Rosana, os fones mais internos acabam entrando em contato com a cera do ouvido. Quando os objetos não são limpos, acabam expostos a outros ambientes e outros micro-organismos que se prendem aos fones.

"Quando a gente coloca o fone, você abafa o canal auricular e isso deixa uma temperatura ideal para aqueles micro-organismos, eles têm alimentos, têm nutrientes. A tendência é aumentar a quantidade. [...]A cera proporciona a aderência de mais micro-organismos, poeira, sujeira, fios de cabelo e isso é prejudicial, porque vai fazer com que esses micro-organismos aumentem ainda mais", explica.

O otorrinolaringologista do Hospital da PUC de Campinas Bruno Bernardo Duarte explica que a cera é uma proteção da orelha, inclusive por ter PH ácido, que não permite, normalmente, o crescimento de fungos e bactérias. No entanto, o uso frequente de fones de ouvido e de cotonetes tende a reduzir a formação de cera, deixando o ouvido mais exposto a riscos de otites.

"Com certeza esse aparelho vai ser contaminado por fungos e bactérias. [...] Num dado momento que não tenha a cera e esteja com a imunidade baixa, pode levar a uma contaminação. Pode aumentar o risco de uma otite externa”, afirma Duarte.

Tratamento difícil

O tratamento dos males provocados à saúde pelo uso de fones não é algo tão simples, segundo o médico otorrinolaringologista. As infecções podem se tornar crônicas.

"São bastante incômodas e difíceis de serem tratadas. A primeira coisa é procurar um otorrino se estiver sentido dor de ouvido, coceira excessiva, diminuição de audição. Se o conduto auditivo estiver inflamado, ele incha. Tem a sensação de que o canal está mais estreito. Pode ter uma secreção geralmente não fétida e, às vezes, a dor é ao tocar. Se ignorar os sintomas pode acontecer um desconforto muito grande, muitas vezes insuportável", explica Duarte.

Durante o tratamento, com medicamentos antifungicos e antibactericidas, o paciente precisa ficar sem usar fones de ouvido e cotonetes por cerca de 15 dias, segundo o médico. O tratamento também costuma ser acompanhado de anti-inflamatórios e analgésicos.

Pesquisador vítima dos fones

O pesquisador Márcio José Evangelista Júnior, de 21 anos, propôs a pesquisa após ser vítima dos fones. Desde a infância tem problemas auriculares recorrentes e há dois anos teve duas infecções no ouvido. Ao fazer exames para investigar a causa, foi constatada a infecção pela bactéria Staphylococcus aureus.

"Usava [fones] boa parte do dia, no ônibus, em casa. Toda hora eu estava com fone, para conversar com as pessoas. [Com a pesquisa] fiquei meio assustado porque vi que era do fone que estava vindo isso. Tive que diminuir o uso e fazer mais higienização, que eu não tinha o costume", conta.

Limpeza eficiente

A limpeza dos fones e headfones deve ser feita com um tipo de álcool que não agride os contatos eletrônicos do aparelho, o álcool isopropílico. Com um cotonete ou um pedaço de algodão, o usuário deve passar o produto na parte que fica em contato com a orelha e também nos fios.

A higiene precisa ser feita todos os dias, antes e após o uso, ou, no mínimo, uma vez por semana. Álcool comum ou água e sabão não devem ser usados, pois podem danificar o fone.

"O ideal é deixá-los em local arejado porque isso ajuda a eliminar os micro-organismos. Principalmente os headfones, porque eles têm uma película e ela vai aderindo, então é ideal que faça a higienização. Deixa ele secar. O problema é a lubrificação e a umidade, que a gente libera pelo suor e pela cera, porque facilita o acúmulo de micro-organismos e sujeiras ", explica.

No caso do headfone, quando ocorrer algum rasgo na película ele deve ser trocado. Mesmo assim, ela reafirma que não é recomendado compartilhar o fone com outras pessoas.

(Foto: Patrícia Teixeira / G1)