CIDADE
Projetos querem reabrir Canecão em até dois anos no Rio.
Espaço tradicional de espetáculos completa 50 anos.
Em 20/06/2017 Referência CORREIO CAPIXABA - Redação Multimídia
Ele chega aos 50 anos, neste dia 20 de junho, alquebrado pelos males do tempo e principalmente da inatividade que já o tortura há sete anos. Mas apesar da idade, ainda é capaz de encantar, emocionar e fazer parte dos sonhos de artistas nacionais e até internacionais. Afinal, a casa de espetáculos Canecão, em Botafogo, na Zona Sul, que durante 43 anos foi o palco mais cobiçado do Rio de Janeiro, está prestes a, tal qual uma fênix, renascer das cinzas. Ou melhor, dos escombros. A ideia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) – proprietária do espaço - é começar reabrir a casa ao público em fevereiro 2018, em um processo que pode levar até 2 anos.
A previsão é de Carlos Vainer, coordenador do Fórum de Ciência e Cultura, da UFRJ. A reabertura se daria em três etapas: a primeira com um Laboratório Público de Restauro até o carnaval de 2018; a segunda com a criação de um café-concerto integrado com a já existente Livraria da UFRJ, ainda no primeiro semestre de 2018; e a reativação da casa de shows em 2020, que ganharia um novo nome.
“Em 2020, a UFRJ completa 200 anos de existência. E a grande festa do bicentenário vai ser lá, tenho certeza. Vamos concretizar esse sonho de reativar esse espaço de arte para a cidade. A universidade reconhece que tem uma dívida com a cidade, que não pode ficar sem um espaço importante para a cultura”, disse Vainer, lembrando que inicialmente tentou-se restaurar o Canecão para a Copa do Mundo de 2014.
Depois de uma disputa judicial pelo espaço que se arrastou por 39 anos, a UFRJ tem planos para restaurar completamente a casa. Fechada desde 2010, o espaço teve arquibancadas, camarins e banheiros destruídos, não tem mais sistemas de ar nem iluminação ou isolamento acústico. Poeira e pichações podem ser vistas em todas as paredes e vidros dão um ar de abandono ao prédio. Não seria nenhuma remodelação tão radical quanto uma plástica que transformaria o Canecão num centro cultural exclusivamente acadêmico. Mas uma espécie de lifting, que permitisse sua reestruturação, mesclando atividades acadêmicas com casa de shows para grandes artistas.
Financimamento ainda incerto
“A primeira estimativa de custo, feita há três anos, era de que seriam necessários R$ 10 milhões para tornar o espaço utilizável, para colocá-la em funcionamento, mas de forma minimalista, com uma estrutura muito simples. Mas a UFRJ não tem esse dinheiro. Por isso, estuda formas de buscar apoio da iniciativa privada, através da Lei Rouanet”, disse Vainer, explicando que a espaço não pode ser alugado, já que por lei, a universidade não poderia ter atividades com fins lucrativos e que não dispensaria nem uma “vaquinha” para ajudar a reabrir o Canecão.
Para a volta da casa, este jovem senhor já ganhou um trato no cabelo. Ou melhor, teve o antigo telhado, que estava cheio de infiltrações, trocado por telhas de metal, que ajudam a impedir que goteiras acelerem a ação do tempo no interior daquela que chegou a ostentar o título de maior e mais moderna casa de espetáculos da América Latina, segundo o musicólogo Ricardo Cravo Albin.
“A destruição do Canecão foi uma inconsequência, um pensamento torto, que acha que é melhor ter a casa fechada e em ruínas. Acho que a UFRJ poderia ter feito um acordo para evitar o desastre que foi fechar a casa que era ponto de referência da cultura carioca. Torço para que algo seja realmente feito. Esses sete anos fechados representam um prejuízo de toda a classe artística. Não se pode perder um espaço tão importante como aquele para nada”, lamentou Albin.
Os projetos já estão sendo elaborados pela UFRJ, que está buscando apoio da iniciativa privada para tirá-los do papel. O primeiro, orçado em cerca de R$ 1,5 milhão, seria a criação de um Laboratório Público de Restauração, que além de ser um espaço de estudos, ajudaria a restaurar o painel “A última ceia”, que Ziraldo pintou para a antiga cervejaria em 1967. O mural de 32 metros extensão e 6 metros de altura teve parte tampada pela instalação de uma arquibancada – na lateral direita da casa – e foi destruído ao ser azulejado para a construção de banheiros e cozinha no local. O laboratório daria uma nova cara ao antigo Canecão.
E se o laboratório funcionaria como uma maquiagem, com mais R$ 2 milhões, a cinquentenária casa de espetáculos começaria a entrar em forma ao ganhar um café-concerto, uma sala com 120 lugares para pequenos eventos, peças teatrais, performances, rodas de leituras, no espaço anexo.
A UFRJ também quer dar uma nova roupagem à antiga cervejaria. Para isso, está buscando apoio para retirar da fachada o antigo arco – instalado anos atrás pela Petrobras – e que segurava o letreiro da casa. E por fim, abriria o palco não só para grandes nomes da música brasileira e até internacional, mas também para produções culturais acadêmicas, a preços mais populares.
Elymar já faz planos
Só de pensar em voltar a pisar no Canecão, o cantor Elymar Santos, diz que sente o corpo arrepiar. Afinal, há 32 anos, antes de se tornar um ídolo, ele hipotecou o apartamento no qual morava na Ilha do Governador e vendeu um carro, para alugar o espaço e realizar seu sonho de cantar no palco mais importante do Rio. Ele conta que a casa transformou sua vida.
“Existe o Elymar A.C. (antes do Canecão) e D.C. (depois do Canecão). O fechamento do Canecão em 2010 me deixou órfão, não sabia como ia viver sem o templo das canções. Acho que toda a classe artística poderia ajudar muito a reerguer o Canecão. Os maiores nomes da música nacional pisaram naquele palco e devem muito a ele. O Rio merece ter aquela casa de volta”, disse o cantor.
E entusiasmado com a possibilidade da reabertura do Canecão, Elymar vai ainda mais longe:
“Vou lhe confidenciar uma coisa: seria capaz de vender o imóvel que tenho no Leblon, para ajudar a abrir o Canecão. Digo sempre que ganho menos que mereço e tenho mais do que preciso. E devo tudo o que sou àquele lugar. Qualquer sacrifício vale para voltar àquele palco. Ele é mágico”.
(Foto: Marco Serra Lima/G1)