POLÍTICA INTERNACIONAL
Turquia realiza eleições presidenciais e legislativas
Vencedor terá poderes reforçados após referendo de 2017.
Em 23/06/2018 Referência CORREIO CAPIXABA - Redação Multimídia
O presidente da Turquia, Recep Tayyip Erdogan, tentará neste domingo (24) um novo mandato com poderes reforçados, em eleições presidenciais nas quais enfrenta uma posição determinada a acabar com seus 15 anos de poder. Mas, caso não consiga mais de 50% dos votos, corre o risco de ter que disputar um segundo turno em 8 de julho.
Também neste domingo os turcos irão eleger os novos ocupantes das 600 cadeiras do Parlamento.
Erdogan, de 64 anos, dirige a Turquia desde 2003, primeiro como primeiro-ministro e depois como presidente.
Ele transformou seu país com projetos e políticas de desenvolvimento voltadas para o crescimento econômico, ao mesmo tempo em que reforçou o discurso religioso muçulmano no país laico e se impôs como ator-chave na arena internacional.
O chefe de Estado agitou em abril o calendário político anunciando a antecipação para 24 de junho das eleições inicialmente previstas para 3 de novembro de 2019.
Uma decisão provavelmente motivada pelo temor da crise econômica que parece atingir o país com uma queda enorme da lira turca, uma inflação de dois dígitos e um déficit significativo em sua balança.
Mais poderes
O resultado das eleições será especialmente importante para a Turquia, já que o vencedor terá poderes reforçados após o referendo de abril de 2017 convocado por Erdogan após o fracassado golpe de julho de 2016. Neste novo sistema, ainda não plenamente em vigor, desaparecerá a figura do primeiro-ministro e o presidente concentrará todo o poder em suas mãos, sem o controle apenas do parlamento.
Desta vez, o presidente turco enfrentou na breve campanha eleitoral uma união inesperada dos partidos de oposição e um concorrente, Muharrem Ince (CHP, social-democrata), capaz de desafiá-lo.
Ainda que Erdogan seja favorito, segundo a France Presse, muitos observadores acreditam que ele não vencerá no primeiro turno e que sua formação, o Partido da Justiça e do Desenvolvimento (AKP), poderia perder sua maioria no Parlamento.
Outros candidatos
Erdogan enfrenta quatro outros candidatos à presidência neste domingo.
O mais popular deles é o ex-professor de física Muharrem Ince, do Partido Republicano do Povo (CHP, socialdemocrata), que se tornou a surpresa da campanha eleitoral, graças à sua tenacidade e a seu estilo combativo, e chegou inclusive a incomodar o atual presidente. É o favorito a enfrentar Erdogan em um possível segundo turno.
Selahattin Demirtas, do Partido Democrático dos Povos (HDP, pró-curdo), já concorreu em 2014, quando obteve 10% dos votos, e é candidato mesmo estando preso desde 2016, acusado de dirigir uma organização "terrorista". Ele denuncia um "sequestro" político, consequência de sua feroz oposição a Erdogan. O candidato detido fez campanha nas redes sociais por meio de seus advogados e aproveitou-se de uma ligação autorizada à esposa para fazer um discurso que foi gravado pelo telefone e transmitido pelo seu partido.
Dogu Perinçek, que dirige o Partido Patriótico (Vatan, esquerda), também já teve problemas com a justiça e foi detido várias vezes, uma delas depois do golpe de Estado militar de 1980. Falou-se muito dele quando recorreu ao Tribunal Europeu de Direitos Humanos (TEDH) para defender seu direito a negar que o massacre dos armênios durante a Primeira Guerra Mundial na Turquia tenha sido um genocídio. O TEDH lhe deu razão.
Temel Karamollaoglu, do Partido da Felicidade (SP, islâmico-conservador), foi três vezes deputado, principalmente, pelo Partido da Prosperidade (Refah). Ele foi colaborador próximo de Necmettin Erbakan, o mentor político de Erdogan.
Única mulher a concorrer ao cargo, Meral Aksener foi a primeira política da oposição a anunciar sua candidatura, à frente do Bom Partido (direita nacionalista) que fundou em outubro. Nacionalista conservadora, ela foi ministra do Interior nos anos 1990 e , durante muito tempo, foi membro do MHP, sigla ultranacionalista que se aliou a Erdogan.
'Energia nova'
A "energia nova" da oposição permitiu orientar o debate durante a campanha pela primeira vez desde a chegada de Erdogan ao poder, explica Asli Aydintasbas, especialista do Conselho Europeu de Relações Internacionais.
Isso forçou, por exemplo, Erdogan a prometer a suspensão do estado de emergência vigente desde o golpe de estado fracassado, depois que outros candidatos o fizeram.
A unidade da oposição é em parte explicada pela apertada vitória do sim no referendo sobre a revisão constitucional para ampliar os poderes presidenciais, aprovada com 51,4% dos votos.
"Esse resultado mostra um voto sólido da oposição que pode ser qualificado como um voto anti-Erdogan", diz Aydintasbas. "Por isso, era natural que a oposição se unisse para consolidar esse voto".
Para Elise Massicard, pesquisadora do Centro Nacional de Pesquisa Científica da França (CNRS), isso também se explica pelo futuro sistema presidencialista e pela vontade de "não deixar a concentração de poderes para Erdogan e o AKP".
Embora os diferentes partidos opositores tenham decidido apresentar seus próprios candidatos para as eleições presidenciais, a maioria concordou em apoiar o candidato que chegar a um hipotético segundo turno contra Erdogan em 8 de julho.
Por outro lado, contra a aliança do AKP e os ultranacionalistas do MHP, vários partidos de oposição, incluindo o CHP e uma nova formação da direita nacionalista, o Bom Partido, aliaram-se para as legislativas.
Coalizão no Parlamento
A chance de não conseguir atingir a maioria nas eleições de domingo já foi admitida por Erdogan, que cogitou publicamente a possibilidade de formar uma coalizão no Parlamento.
"Se a 'Aliança do Povo' conquistar 300 assentos (dos 600), o problema foi resolvido. Se terminar abaixo de 300, poderíamos procurar formar uma coalizão", disse o chefe de Estado turco, em uma entrevista na quarta-feira (20) à noite.
"Vamos ver no domingo", acrescentou, sem especificar com que formação política pretendia formar essa coalizão, segundo a AFP.
O Partido da Justiça e Desenvolvimento (AKP, islamo-conservador) do presidente Erdogan se apresenta nestas eleições com seu aliado o Partido da Ação Nacionalista (MHP, ultranacionalista).
À frente deles, a oposição formou a "Aliança da Nação", que reúne o Partido Republicano do Povo (CHP, social-democrata), o jovem Bom Partido (direita nacionalista) e Saadet (conservador).
Três formações vão disputar sozinhas: o Partido Democrático dos Povos (HDP, pró-curdo e abertamente anti-Erdogan), e dois partidos que têm poucas chances de superar os 10% dos votos necessários para entrar no Parlamento, Huda-Par (curdo islâmico) e o Partido Patriótico (VP, esquerda).
(Foto: Presidency Press Service via AP, Pool)