SAÚDE
Pacientes com infertilidade podem recorrer por direitos, diz especialista.
Luciano Correia Bueno Brandão, advogado especialista em Direito à Saúde
Em 15/09/2016 Referência CORREIO CAPIXABA - Redação Multimídia
Estima-se que, no Brasil, cerca de 2 milhões de casais apresentam problemas de infertilidade. Um levantamento estatístico aponta que 30% das causas de infertilidade são femininas, 30% são masculinas e 25% decorrem de problemas do casal, tanto do homem quanto da mulher. A medicina moderna dispõe de inúmeras técnicas para ajudar no tratamento de infertilidade, desde as mais simples até as mais complexas - por exemplo, a fertilização in vitro e a injeção intracitoplasmática de espermatozoides. A questão é que tais tratamentos nem sempre são financeiramente acessíveis e normalmente não possuem cobertura por planos de saúde.
A Lei estabelece ser obrigatória a cobertura pelos planos de saúde
Isso ocorre porque a legislação que dispõe sobre os planos e seguros privados de assistência à saúde prevê, expressamente, a possibilidade de exclusão de tratamentos como a inseminação artificial. Por outro lado, a mesma lei – que foi alterada em 2009 – estabelece ser obrigatória a cobertura pelos planos de saúde no que diz respeito ao planejamento familiar.
A fim de evitar contradições, a Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), editou a Resolução Normativa nº 192/2009, na qual apontou expressamente em seu artigo 1º, § 2º que: “A inseminação artificial e o fornecimento de medicamentos de uso domiciliar (...) não são de cobertura obrigatória e não estão incluídos na abrangência desta Resolução”. Contudo, não obstante o teor da Resolução ANS 192, parece-nos que há margem suficiente para fundamentar discussões judiciais. Em primeiro lugar, porque a Resolução da ANS, enquanto dispositivo normativo, tem alcance limitado vez que não pode contrariar texto de lei.
A Lei 9.263/96
Com efeito, a Lei 9.263/96 considera como planejamento familiar “(…) o conjunto de ações de regulação da fecundidade que garanta direitos iguais de constituição, limitação ou aumento da prole pela mulher, pelo homem ou pelo casal”. Ora, nesse contexto, a noção de planejamento familiar inclui não apenas os métodos de contracepção, como laqueadura das trompas e vasectomia, mas também os de concepção, como a fertilização in vitro e a inseminação artificial.
Além disso, a infertilidade é uma doença, inclusive reconhecida pela Organização Mundial de Saúde (OMS) por meio da Classificação Internacional de Doenças. Os planos de saúde, de maneira geral, devem cobrir o tratamento a doenças reconhecidas pela OMS. Dessa forma, parece-nos que diante de eventual exclusão contratual na cobertura de tratamentos de infertilidade podem ser questionados judicialmente, garantindo-se a mais ampla cobertura, no que toca ao planejamento familiar nos termos da lei (que, sempre é bom lembrar, não pode ser restringido por dispositivos normativos de menor hierarquia legal).
A exclusão de cobertura
Também a Justiça vem se posicionando no sentido de considerar a exclusão de cobertura deste tipo de procedimento abusiva: “PLANO DE SAÚDE – Exclusão contratual da fertilização in vitro– Abusividade – Violação à Lei nº.9.656/98, que expressamente estabelece a obrigatoriedade de cobertura do atendimento nos casos de planejamento familiar – patologia, ademais, prevista na Classificação Estatística Internacional de Doenças e Problemas Relacionados com a Saúde, da Organização Mundial de Saúde – Ação procedente – Sentença reformada – RECURSO PROVIDO” (TJ-SP).
A questão do tratamento de infertilidade vai muito além de mera estipulação contratual. A maternidade e a paternidade abrangem aspectos que englobam a dignidade da pessoa humana e da própria família; entidade que, é bom lembrar, goza de plena proteção constitucional. Dessa forma, casais que tenham indicação médica para o tratamento da infertilidade mediante adoção de procedimentos como inseminação artificial e fertilização in vitro e encontrem recusa de cobertura por parte de convênios médicos, podem recorrer ao Judiciário para fazer valer este direito.
Por Luciano Correia Bueno Brandão, advogado especialista em Direito à Saúde, do escritório Bueno Brandão Advocacia (http://www.buenobrandao.adv.br/).
Colaboração da jornalista Alessandra Sabbag